Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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DANDO VOZ ÀS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Patrícia Krieger Grossi, Jaqueline Goulart Vincensi, Sonia Maria Araújo Figueiredo Almeida, Andréia Mendes dos Santos

Resumo


Estudos e pesquisas encomendadas pelo Ministério da Saúde e pela ONU apontam que a violência contra a mulher atinge milhares de brasileiras, independente de idade, etnia e classe social, além da maioria dos casos ocorrerem dentro do próprio lar, tendo o cônjuge/companheiro, como o agressor. Segundo a Pesquisa Perseu Abramo (2010), a cada 24 segundos uma mulher é violentada no País. O Brasil vive um tempo de afirmação das políticas públicas, com a adoção de sistemas institucionais que apresentam níveis crescentes de integração, envolvendo as três esferas de governo e de democratização, com o fortalecimento do controle social, através das conferências, dos conselhos e da participação popular direta. O presente resumo tem por objetivo verificar os avanços e desafios da lei Maria da Penha na implementação das políticas de enfrentamento à violência doméstica contra a mulher no Estado do RS. Neste resumo, estamos apresentando os resultados parciais a partir dos grupos focais realizados com mulheres em situação de violência. Metodologia Estudo de caráter exploratório e descritivo, com abordagem qualitativa e referencial dialético-crítico. A coleta de dados foi organizada em duas etapas: a- mapeamento dos CREAS e CRAS nos municípios da amostra;b- seleção de 11 municípios.As técnicas e instrumentos utilizados foram: a) grupo focal com mulheres em situação de violência doméstica; b) entrevistas com gestores e profissionais. Os dados qualitativos estão sendo submetidos à análise de conteúdo com recorte temático com base em Bardin (1977). Resultados Até o momento foram realizadas vinte e uma(21) entrevistas com os profissionais e oito(08) grupos focais commulheres vítimas de violência doméstica. Percebe-se nas falas das mulheres que a Lei Maria da Penha foi um avanço na proteção das mulheres, sendo que “alguns temem a lei”, porém outros“desrespeitam” as medidas protetivas. Isto revela a complexidade em torno da questão e a necessidade de políticas públicas intersetoriais que garantam a segurança da mulher em risco de vida, como casas-abrigos, entre outras, uma vez que medida cautelar de afastamento não é sempre garantia de proteção. Houve um consenso em ambos os grupos de que a violência psicológica machuca muitas vezes mais do que a violência física, exemplificado na fala de uma delas: “Não precisa tu batê, tu machucá, bofeteia pra ser violência (...) tem umas palavras que é pior do que dando uma pancada” (sic). A Lei Maria da Penha foi um avanço, pois passa a reconhecer a violência psicológica sofrida pelas mulheres. Os extratos de depoimentos das mulheres em relação ao conhecimento e uso da Lei Maria da Penha refletem este avanços, pois “A mulher não tinha aquele apoio né, aonde ela ia se ampara. E assim com essa lei, tem aonde ela se dirigir” (GF2). “O que eu acho interessante são as medidas protetivas, eu fiz isso na segunda feira e na quarta feira eu voltei pra minha casa, então, pra mim até agora, ela foi eficiente” (GF4). “A gente ouve os relatos da televisão né, que é o que geralmente é o que acho que tá desencadeando a maioria das mulheres a procurar seus direitos né” (GF6). “Essa Lei Maria da Penha foi um respeito” (GF1). A mídia tem um papel importante ao discutir a temática da violência e informar sobre o acesso aos serviços da rede de proteção, considerando que muitas mulheres em situação de violência doméstica permanecem isoladas. Uma das participantes da pesquisa refere que a Lei Maria da Penha não atendeu as suas necessidades, pois: “Eu fui agredida juntamente com o meu filho, ele é de colo, só que até agora eu sai da casa e não voltei ainda, o agressor continua na casa, ele continua levando a vida normal como ele sempre teve,e eu até agora, pra mim com relação aos meus direitos eu não vi nada” (GF8). Discussão Nas falas das mulheres do estudo, ficam presentes várias expressões de violência tipificadas na Lei Maria da Penha, especialmente a violência psicológica, violência moral e sexual.Dentre as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha, Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006 destacamos as seguintes: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria (Art. 7º, Lei 11.340/2006). Em relação às políticas de enfrentamento à violência contra a mulher, estas utilizaram hospitais e postos de saúde, Delegacias das Mulheres ou comuns, Casas abrigo, atendimento individualizado com psicólogas e assistentes sociais e grupos de discussão coletiva dentro dos CRAS e CREAS para a discussão sobre a Lei Maria da Penha e cidadania.Porém, a abordagem grupal não era ofertada em todos os serviços dos CRAS e CREAS dos municípios. Verifica-se que existem estratégias dos municípios para sensibilização em relação à Lei Maria da Penha, as quais são realizadas através de: visitas domiciliares, grupos, seminários na comunidade e capacitação de profissionais e agentes de saúde para identificação da violência e orientação às mulheres na perspectiva de garantia dos direitos previstos na Lei. Além da rede específica às mulheres, algumas acessavam o Conselho Tutelar, tendo em vista que a maioria das crianças e adolescentes também sofriam violência doméstica. Os grupos foram considerados positivos pelas mulheres, contribuindo para a desnaturalização das formas de opressão de gênero instituídas na sociedade que contribuem para sua subalternização. Considerações finais Os dados apontam que a mulher conhece a Lei Maria da Penha, principalmente a medida de afastamento do agressor do lar, porém ainda existe uma fragilidade na articulação da rede de proteção à mulher, havendo a necessidade de efetivação das políticas intersetoriais para o atendimento dessa demanda como programas de inserção produtiva e geração de renda para promover a autonomia financeira das mulheres e centros de reabilitação para homens agressores para romper com a reprodução da violência nas relações familiares e sociais. Referências BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa/Portugal: Edições 70, Ltda, 1977, 225 p. BRASIL. Lei Maria da Penha. LEI 11.340, de 07 de agosto de 2006. PERSEU ABRAMO. Pesquisa intitulada: Mulheres Brasileiras nos Espaços Público e Privado, 2010. Disponível em: www.fpabramo.org.br