Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


Tamanho da fonte: 
Fóruns de Comunidade do Orkut como espaço de educação e participação sobre tuberculose: observação etnográfica virtual
Danielle Barros Silva Fortuna, Valdir de Castro Oliveira, Thiago Petra da Silva, Nilton Bahlis dos Santos

Resumo


A tuberculose (TB) permanece como uma das principais causas de óbitos de adultos no mundo.No Brasil,foi definida como problema prioritário de saúde.Uma das dificuldades para tratar a TB é o alto índice de abandono e falta de informação. Conforme pesquisa DataUFF(2010),“o desconhecimento sobre tuberculose propicia atitudes preconceituosas que terminam por discriminar e isolar as pessoas com a doença,(...) os doentes estigmatizados retardam a busca por atendimento,realização de exames diagnósticos e tem dificuldades de adesão ao tratamento;(...)esses fatores interferem na cura”.Com a evolução tecnológica e crescente acesso à informação científica pela população, tem surgido um novo perfil de paciente,“o paciente expert,que busca informações sobre sua doença,sintomas,medicamento, tratamento,etc.”.Inúmeras são as motivações que levam pessoas com patologia a buscar informações na Internet (web),e o interesse em comum tem propiciado a formação das comunidades virtuais(GARBIM et al,2008).A TB é uma doença estigmatizada, e, nesses espaços, as pessoas podem utilizar a web para construir e partilhar inteligência coletiva: emitir e obter informação,debater temas,prestar e receber solidariedade, tudo isso preservando a identidade.Tomamos o ciberespaço como um cenário de sociabilidade heterogêneo e assimétrico, semelhante ao das sociedades complexas. Assim,ao constituir-se um novo ambiente,outras foras de relações sociais são geradas,com códigos e estruturas próprias. Assim,a experiência de alteridade é vivida de maneira intensa nesses ambientes”(Sarmento e Eckert,2006).Levy (1999)afirma que,como as comunidades reais,as virtuais se agrupam segundo afinidades,valores comuns,em um processo de cooperação e troca,sem barreiras geográficas.Uma vez conectado,o cidadão tem condições de interferir diretamente,em mediadores,o que pode ajudar a descentralizar e democratizar os serviços públicos.Pesquisas recentes destacam o uso crescente da web relativo à saúde.Talvez por esta razão,o Ministério da Saúde em suas campanhas e ações,tem buscado se valer das redes sociais e sites de relacionamento para se aproximar do público.Todos esses fatores fazem da comunidade virtual um potencial “laboratório” para análise em pesquisas qualitativas em Educação e Saúde.Nosso objetivo é relatar uma pesquisa exploratória, que vem sendo feita em uma comunidade no Orkut sobre TB.Para entendermos como se dão as mediações e compartilhamento de saberes utilizamos dados secundários existentes na comunidade.Utilizamos a “observação passiva” da etnografia virtual (RAMOS et al, 2011),que consiste em observar sem interagir com os membros. A etnografia virtual visa decodificar a experiência humana presente nas comunidades virtuais com intuito de conhecer os sentidos,significados e lógicas subjacentes aos comportamentos e valores expostos.Adotamos o pressuposto teórico de educação como prática libertadora, voltada à construção da consciência crítica como forma de intervenção no mundo segundo Paulo Freire.Assim,a educação é tida como indissociável à participação,pois para construir saberes,educador e educando compartilham conhecimentos e ações,ambos como agentes.A comunidade “Tuberculose” foi escolhida por conter o maior número de membros (553) (até 6/12/2011);por seu caráter público(comunidade não-moderada, visível ao público, inclusive para não inscritos no Orkut) e fórum de discussão ativo. Buscamos investigar quais assuntos são mais abordados,a postura nas discussões,e a interação nos tópicos.De junho/2006 a dezembro/ 2011 foram quantificados 662 tópicos no fórum.Observamos a predominância de tópicos com dúvidas sobre a doença (tipos,sintomas,exames, tratamento,imunidade,transmissão,prevenção,vacina,recidiva,alimentação ideal,tratamentos alternativos,etc.);sobre depressão e efeitos colaterais dos medicamentos;muitos tópicos sobre preconceitos e estigma,tópicos contando histórias de vida, desabafos,relatos,de como se descobriu com a doença (tópicos inteiros com duração de cerca de dois anos,da primeira à última postagem,contando desde o dia do diagnóstico da doença,todas dificuldades vivenciadas, até o desfecho de cura). Chamou atenção a atitude de solidariedade e afeto entre os membros da comunidade, pessoas que relataram que graças à ajuda das pessoas que estavam em contato, tinham forças para continuar o tratamento e não sucumbir à depressão;pedidos de ajuda, conselhos,medo da morte;apresentações pessoais (nome, idade, profissão,etc),poesias,mensagens, sugestões de leitura,religiosidade,questões culturais;TB e emprego;TB na mídia;sobre seus mitos,a mobilização para participação nas conferencias de saúde, dia da luta contra TB e discussão das políticas públicas;debates sobre o atendimento no SUS;direitos (auxílio doença,acesso a remédios, auxílio alimentação,etc.);controle social,questões jurídicas;relação médico-paciente;membros declarando que estão fazendo trabalhos científicos (com apoio dos participantes da comunidade).Por outro lado,também foi observado: discussões,conflitos pessoais,pessoas que abandonaram o tratamento,falta de cortesia,denúncias dirigidas a membros da comunidade,expulsão de membros por “mau comportamento”,etc.Um ponto que merece destaque é que no tópico “profissão e idade” grande parte tinha até 35 anos,trabalhando e com formação universitária.Isso ajuda a ultrapassar a idéia de que TB atinge somente pobres,ainda que mais a estes,pela vulnerabilidade social,mas, sobretudo àqueles que estão com a imunidade baixa(seja rico, classe média ou pobre).Entre os atores sociais notamos: pessoas ligadas a movimentos sociais,pessoas que tiveram TB ou algum caso na família,profissionais de saúde e da Educação.Entre os perfis institucionais: Ministério da Saúde,hospitais e laboratórios.Os principais atores sociais s posicionam defendendo o SUS como ideal para a busca ao tratamento,contudo discutem e criticam as políticas de saúde e incentivam que membros da comunidade reivindiquem direitos.Mobilizam para discussão e participação de eventos sobre TB e Conferências de Saúde.Verificamos que esta comunidade é um espaço fértil de interações,troca de saberes,a partir da educação dialógica, participativa.Há predomínio de relatos de experiências,rede de solidariedade e discussão sobre políticas públicas de saúde para TB.Os espaços virtuais e seus usuários,resguardados os aspectos éticos,se configuram como ricas fontes de pesquisa qualitativa.DATAUFF.Pesquisa de avaliação dos conhecimentos da população sobre Tuberculose. Projeto Fundo Global Tuberculose Brasil,2010.GARBIN,H.B.R.;PEREIRA NETO,A.F.; GUILAM,M.C.R.Internet, el paciente experto y la práctica médica: un análisis bibliográfico. Interface, v.12, n.26, p.579-88, 2008.LEVY, P.Cibercultura.São Paulo: Editora 34,1999.RAMOS,J.S.;NETO,A.F.P.;BAGRICHEVSKY,M.Cultura de la identidad pro-anorexia: características de un estilo de vida en una comunidad virtual. Interface.,v.15, n.37, 2011.SARMENTO,A.ECKERT,C.Desvendando múltiplas máscaras do jogo social no mundo virtual: estudo antropológico sobre o fenômeno do orkut. Iluminuras, v. 7, n.16,2006.