Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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O Acolhimento enquanto fio de “linha” da construção de redes em Saúde Pública
Débora Cristina Rocha da Costa

Resumo


Tecer a rede: um percurso introdutório O Acolhimento no CAPS II Prado Veppo se caracteriza como uma construção coletiva da equipe de profissionais deste serviço. O percurso de sua implantação enquanto Dispositivo iniciou em julho de 2008, através do processo de supervisão institucional com o objetivo de modificar a vigente metodologia de triagens no Serviço. A sistematização da Diretriz do Acolhimento enquanto dispositivo de trabalho ocorreu através desta pesquisa-intervenção. Tecer a rede e a história: o trabalho no CAPSAo longo da presente intervenção uma série de parcerias na rede de Serviços de Saúde e intersetoriais foram desenvolvidas e consolidadas. Dentre elas: a relação de trocas com a Atenção Básica (ESFs e UBSs), a aproximação com o Hospital Universitário de Santa Maria, o fortalecimento da relação entre os Serviços de Saúde Mental (CAPS II, CAPS AD e CAPS i), a consolidação de uma parceria intersetorial com a Casa de Cultura (SMC), a relação de apoio mútuo com as IES (ULBRA, UFSM, FISMA). Sobre redes e linhas: uma breve apresentação do Plano de Intervenção Nesta Intervenção trabalhei com o dispositivo a partir da diretriz do Acolhimento que se caracteriza como um “processo constitutivo das práticas de produção e promoção da saúde que implica responsabilização do trabalhador equipe pelo usuário, desde a sua chegada até a sua saída” (MINISTÉRIO DA SAÚDE: 2008, 51). O Acolhimento é uma postura ética, uma atitude de escuta e de aceitação do outro em sua integralidade. Neste sentido, exercitar a dimensão ética do acolhimento nas práticas em serviços de saúde implica mobilização e construção de rede entre os próprios serviços, em uma postura de inclusão através da integralidade. Assim, o presente Plano de Intervenção trata da construção de redes entre os Serviços SUS através da inclusão da proposta da diretriz Acolhimento nas ações e processos de trabalho do CAPS II Prado Veppo. A presente Intervenção apresentou, como forma de Avaliação e Monitoramento, o trabalho da análise de dados da documentação (fichas de acolhimento), instrumento de avaliação (a ser preenchido por usuários, funcionários locais e representantes de outros Serviços), além das experiências com rodas de conversa com os trabalhadores do CAPS II Prado Veppo, em reuniões de equipe. A linha que tecemos: a implantação da Diretriz do Acolhimento Exercitar o Acolhimento conforme a Política Nacional de Humanização do Sistema Único de Saúde implica na construção de processos de trabalho pautados na inclusão dos usuários enquanto seres dotados de integralidade, diferenças e cidadania. A Integralidade pode ser considerada como um dispositivo político, uma vez que permeia as ações referentes às práticas de cuidado no cotidiano dos Serviços de Saúde (PINHEIRO & GUIZARDI: 2004). Desta forma, PINHEIRO et ali (2005) resgata o direito de cidadania do usuário SUS e neste âmbito o direito à saúde como exercício desta cidadania. Para tanto, a lógica de trabalho nas instituições e serviços do setor público deve estar pautada na ética da co-responsabilização. O CAPS II Prado Veppo vêm se reestruturando conforme uma nova lógica de atuação perante o desafiador exercício de produzir e promover saúde mental. É desta história que faço parte e desta parte que faço história rumo à construção do SUS que dá certo. O presente Plano de Intervenção nasce e se estrutura a partir de ações que já vinham sendo desenvolvidas no CAPS impulsionadas por movimentos institucionais que ocorreram no primeiro semestre de 2008: troca de equipe de funcionários contratados, por profissionais concursados, qualificação desta equipe através da Supervisão Institucional, mudanças na receptividade de novos usuários e no fluxo dos usuários que freqüentam o serviço, inserção do plano terapêutico como proposta e direção de tratamento, conseqüentemente a visualização de uma “alta” para usuários que já estavam institucionalizados e dependentes da rotina do serviço. Ao longo do segundo semestre de 2008, fomos aos poucos desenvolvendo uma nova forma de escuta e intervenção perante nossos usuários. Esta mudança em nossos processos de trabalho implicou na superação de muitos desafios conceituais, metodológicos, ideológicos e, principalmente, no que tange a dimensão do conflito nas relações. Neste sentido, a gestão do conflito consistiu em ser a primeira estratégia deste plano de intervenção. Foi através deste primeiro movimento de disputa de sentidos, de circulação da palavra que a PNH pôde ser introduzida na rotina do serviço. A construção da roda como espaço adequado para a gestão do conflito foi o segundo momento da intervenção. A implantação da diretriz Acolhimento no CAPS II Prado Veppo só está sendo possível porque aprendemos, enquanto equipe, a fazer com que a palavra circule no espaço de roda. Ou seja, estamos aprendendo a ser protagonistas de nossa própria história, através da co-responsabilização pelo nosso próprio espaço e pela nossa palavra. Ou seja, acolhemos nossa própria subjetividade e estamos desenvolvendo a escuta em nossa rotina de trabalho. Sobre redes e “nós”: entre tramas de afetos e conflitos Ao longo do desenvolvimento desta Intervenção processos institucionais foram desencadeados e com estes afetos potencializados, aquecidos, dinamizados. Promover uma estratégia de intervenção institucional implica diretamente em uma atuação amparada pela gestão de conflito. Assim, esta intervenção em implantação da diretriz do acolhimento passou por diversas tramas, onde os nós (pontos de conflitos) se entrelaçaram a partir de “nós” (sujeitos – de desejo, agenciadores, sociais, históricos). Estes nós não poderiam ser definidos como pontos finais a partir dos quais se encerra um ciclo, nem como empecilhos para laços futuros, mas, sim, como entrelaçamentos através dos quais desafios se firmam. Desafios que incessantemente agenciam outros nós. Ao longo deste plano de intervenção alguns nós foram identificados através do monitoramento das ações: as dificuldades da “equipe” em aceitar – acolher – mudanças no seu processo de trabalho, as relações entre os Serviços da Saúde Mental do Município, a produção de um espaço de trocas efetivo – onde a palavra pudesse circular na dimensão do afeto e na dimensão do respeito ao outro, semelhante na diferença. Assim, a avaliação desta intervenção demonstrou que a implantação da diretriz do Acolhimento se potencializa na consolidação das tramas que promovem redes. Bem como as redes se fortalecem em seus nós, como no desafio de implantar o ato e a ética do acolhimento. Tecer a rede e alinhavos finais Nesta constante busca pelo SUS que dá certo e pela qualificação dos nossos serviços na atenção aos usuários busquei, neste breve trabalho, resgatar o ato de tecer rede e história (que nos envolve cotidianamente, politicamente, eticamente). Por conseguinte, traçar os rumos da história do SUS tem que ser mais que o desempenho em uma simples tarefa rotineira. Trabalhar a saúde pública de acesso universal, integral, igualitário tem de ser uma escolha de vida, uma lógica existencial vinculada a um paradigma estético. Assim, envolver-me no trabalho com a proposta da Política Nacional de Humanização está sendo um permanente desafio em minha prática. Desafio que envolve relações, teorias, fazeres, vivências, afetos e, principalmente, pessoas, sujeitos agenciadores de vidas e desejos. Constantes devires nos processos de produção humanos. Linhas que tecemos são redes que formamos? Algumas Considerações Se por uma via, o Acolhimento no CAPS II Prado Veppo já é uma realidade, por outra, eventualmente nos deparamos com uma sensação de impotência perante determinados usuários e situações que envolvem outros pontos da rede. Então, qual o caminho a seguir? Diante de nossa realidade e de nossos desafios a possível via de acesso à mudança consiste, em um primeiro momento, em assumirmos a co-responsabilidade e a co-gestão do conflito. Desta forma, identifico que nossa rede está frágil, em parte, porque na ansiedade de acolhermos as pessoas que recebemos estamos nos esquecendo de acolher as dificuldades próprias dos outros Serviços e Instituições. Assim, proporcionar um espaço para a construção de sentidos sobre a Diretriz do Acolhimento, dentro e fora do Serviço, consistiu em estratégia fundamental desta Intervenção. E assim, a partir dos nós e de nós, poderemos tecer as redes (com afetos e sentidos) que nos aquecem e movimentam. Bibliografia: CAMPOS, Gastão Wagner de Sousa. Humanização na saúde: um projeto em defesa da vida?. In: Interface (Botucatu), Botucatu, v. 9, n. 17, 2005. BENEVIDES, Regina; PASSOS, Eduardo. Humanização na saúde: um novo modismo?. Interface (Botucatu) , Botucatu, v. 9, n. 17, 2005 . BARROS de BARROS. M. 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Algumas Considerações Sobre os Nexos Constituintes das Práticas de Integralidade. In: PINHEIRO, Roseni & MATTOS, Ruben Araújo de. (org). Construção social da demanda: direito à saúde, trabalho em equipe, participação e espaços públicos. Rio de Janeiro: CEPESC/UERJ: ABRASCO, 2005. TEIXEIRA. R.R. O acolhimento num serviço de saúde entendido como uma rede de conversações. In: PINHEIRO, R.; MATTOS, R.A. (org). Construção da Integralidade: Cotidiano, Saberes e Práticas de Saúde. RJ: UERJ/MS/ABRASCO, 2003.