Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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O PROCESSO DE CRIAÇÃO DE UMA CULTURA DE MATRICIAMENTO: A EXPERIÊNCIA DE IMPLEMENTAÇÃO DO NASF SAPUCAIA DO SUL/RS
Marielly de Moraes, Elissandra Siqueira, Bárbara Leite, Diogo S. H. A., Carla Marien Peres, Karla Poersch, Cristina Schwarz, Camila M. R. Noguez

Resumo


INTRODUÇÃO: Em dezembro de 2010, no município de Sapucaia do Sul - RS, foi implantado um Núcleo de Apoio à Saúde da Família – NASF constituído por educador físico, nutricionista, psicóloga, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais. A formação deste NASF ocorreu em um momento de intensas transformações na gestão da Atenção Primária à Saúde do município, que passou a apoiar-se em três pilares: atuar na lógica do apoio institucional e matricial, educação permanente e co-gestão. Sapucaia do Sul localiza-se na região metropolitana de Porto Alegre – RS e possui 129.615 habitantes, conforme o Censo de 2010. A rede de Atenção Primária à Saúde do município é constituída por 13 Estratégias de Saúde da Família (ESF) e 5 Unidades Básicas de Saúde. A atenção secundária é composta pelos serviços: CAPS II, CAPS AD, Clínica de Saúde da Mulher - CLISAM, Unidade Central de Especialidades - UCE, Serviço de Pronto Atendimento – SPA e Infectologia. Na atenção terciária, conta-se com o Hospital Municipal Getúlio Vargas. No escopo das ações da Atenção Primária, tendo como diretriz o apoio matricial junto às 13 ESF de Sapucaia do Sul, o NASF visou sustentar seu trabalho nas dimensões de suporte assistencial e técnico-pedagógico, tendo como objetivo criar espaços de discussão para a gestão do cuidado, articular a rede com outros níveis de atenção e outros setores, e ampliar o repertório de atuação e a resolutividade das equipes de Saúde da Família (SF). OBJETIVO: A proposta deste trabalho é descrever e compartilhar a experiência de implantação do NASF no município de Sapucaia do Sul e as repercussões já observadas em seu primeiro ano de atuação. MÉTODO: O primeiro movimento da equipe deste NASF foi de apropriação da proposta do matriciamento em saúde, nova para todos os membros da equipe. Percebeu-se a necessidade de (re)conhecer e construir uma linguagem comum a partir da diversidade de núcleos, que marca um encontro multiprofissional. Fez parte desse momento a troca de expectativas acerca do trabalho a ser desenvolvido pelos colegas. O apoio matricial foi organizado por meio de “rodadas” (reuniões) realizadas nas equipes da ESF. Primeiramente, conheceu-se a infraestrutura das 13 ESF com breve apresentação dos profissionais, para posteriormente realizar as rodas de conversa sobre a proposta do NASF junto às equipes, que abordou integralidade, intersetorialidade, campo e núcleo de saberes, projeto terapêutico singular, educação permanente e controle social, no intuito de construir vínculo com os atores da rede de saúde. Assim, a primeira “rodada” consistiu na apresentação do NASF e inseriu no debate alguns de seus preceitos de ação. Após este momento, iniciou-se o planejamento das ações a serem realizadas pelos apoiadores matriciais em parceria com os profissionais das equipes de SF. Este planejamento se deu a partir da exposição e problematização de demandas trazidas por cada uma das 13 equipes, onde foram identificadas as prioridades de cada território. A partir da apresentação da proposta do apoio matricial às equipes de SF e do planejamento das ações do NASF junto a estas, alguns critérios foram pactuados entre o NASF e as ESF para atender às demandas trazidas. Entre eles, podemos destacar que as demandas seriam priorizadas a partir de alguns critérios (urgência, abrangência da ação, etc) e deveriam sempre estar alinhadas com as diretrizes da gestão do município. Uma demanda presente na maioria das equipes dizia respeito a um modo de gestão do cuidado em que se atravessavam distintas áreas estratégicas de intervenção. Assim, o NASF passou a compartilhar com as equipes o cuidado de usuários cujos casos demandavam intervenções que tensionavam a divisão tradicional entre diversos âmbitos do cuidado em saúde e diferentes núcleos profissionais. RESULTADOS: Os profissionais que atuam na equipe do NASF tiveram três focos de atuação: as equipes de SF, a população residente no território de abrangência de tais equipes e a gestão em saúde do município. Com relação aos dois primeiros focos, atuando na lógica do matriciamento, ofereceu-se às equipes de SF tanto apoio referente a questões assistenciais – o que acontece principalmente através de discussões de caso, visitas domiciliares e interconsultas – quanto suporte técnico-pedagógico, por exemplo, na criação e acompanhamento dos grupos, que pode se dar tanto de forma indireta, no planejamento destes, como de forma direta com a participação do profissional do NASF. Desde o início da implantação do NASF, foi observada uma expectativa muito grande, por parte das equipes de SF, de que o NASF funcionasse como uma equipe de atendimento especializado, para a qual os usuários que necessitassem de algum atendimento relacionado a algum dos núcleos específicos seriam encaminhados. Neste momento, a postura dos apoiadores matriciais do NASF foi priorizar o apoio às equipes de SF, para que estas se capacitassem a lidar com tais situações. Diante das diretrizes do Ministério da Saúde em relação ao NASF, optou-se pela realização de intervenções somente em conjunto com profissionais da ESF. Assim, as intervenções diretas com o usuário eram realizadas apenas quando realmente necessário e sempre em conjunto com um profissional da equipe de referência, a fim de garantir que a coordenação do cuidado do usuário permanecesse a cargo da equipe de SF, o que resultou em certa inquietação tanto para os profissionais das ESF quanto para os integrantes do NASF. Tal reação inicial, contudo, foi sendo dissolvida à medida que as equipes de SF perceberam uma ampliação da efetividade de suas ações a partir do respaldo dos apoiadores matriciais. Sistematicamente, podemos dizer que os casos compartilhados entre ESF e NASF seguiram algumas etapas: o primeiro passo era a discussão de caso com a equipe de SF, onde os apoiadores buscariam, em conjunto com a equipe de referência, possibilidades de intervenção. Caso fosse necessária uma atuação direta do profissional do NASF com o usuário, o segundo passo seria a realização de visitas domiciliares ou de interconsultas junto a um profissional da equipe de SF. Em um terceiro momento, o caso poderia voltar a ser discutido e seu acompanhamento organizado mantendo a lógica de co-gestão do cuidado, tendo a participação do profissional do NASF o intuito de ampliar as possibilidades de troca de conhecimentos entre profissionais, de leitura das situações cotidianas vividas na ESF e resolução dos problemas vividos em seu território. Da mesma forma, os grupos realizados na ESF também passariam por estas etapas, estando sempre a cargo de um profissional da ESF e recebendo apoio do NASF em seu planejamento e na realização de seus encontros, se as equipes julgassem necessário. Em nossa experiência, o planejamento do trabalho foi organizado a partir da Pactuação de Apoio e do Projeto de Saúde no Território junto às equipes da SF, contando com a aproximação e a articulação com diferentes Secretarias. Para subsidiar o planejamento das ações e o matriciamento em si, fez-se uso, sobretudo, da Educação Permanente, que compreende a discussão de casos in loco, a realização de seminários e o atendimento conjunto com os trabalhadores de referência ESF, de modo a colocar os profissionais envolvidos no exercício de pensar estratégias terapêuticas coletivamente, incluindo o usuário. A equipe do NASF ocupou também espaços na gestão da saúde do município, através da participação no Colegiado Gestor da Atenção Primária à Saúde e nos Grupos de Trabalhos (GT), que envolveram diversos atores da saúde com o intuito de contribuir na pactuação de fluxos do município - GT Linhas de Cuidado, GT Educação Permanente, GT Saúde Mental e GT Territorialização. CONCLUSÃO: As atividades de vigilância - tais como mapeamento das atividades coletivas já existentes no território das unidades, o número de idas até às equipes, o quantitativo de casos atendidos e reuniões que contavam com a presença do NASF - foram de suma importância para a visualização e planejamento das ações das equipes de SF que se constituíam numa nova cultura de cuidado compartilhado. Entende-se que as rodadas realizadas, planejadas com antecedência pela equipe do NASF, foram fundamentais para afinar, amadurecer, avaliar, repensar e dar continuidade às ações de apoio junto às ESF.