Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


Tamanho da fonte: 
A EXPERIÊNCIA DO TRABALHO INTERSETORIAL NO CUIDADO A SAÚDE INTEGRAL DOS ADOLESCENTES
Welington Serra Lazarini

Resumo


O fenômeno da adolescência constitui-se em um dos períodos do ciclo vital onde o indivíduo encontra-se mais vulnerável. Para alguns autores, o conceito de adolescência engloba e ultrapassa o de puberdade, que é, em geral, reservado para as modificações físicas que ocorrem, em média, na faixa dos dez aos quatorze anos. Embora se trate de uma fase peculiar de transição biopsicossocial, a adolescência caracteriza-se pelas transformações biológicas e pela busca da definição de um papel social, determinado pelos padrões culturais do meio. No Brasil, alguns dos fatores responsáveis pelo complexo quadro de privações que grande parte dos adolescentes enfrenta, possuem suas raízes fincadas na extrema desigualdade, na migração para os centros urbanos, na precariedade de moradia e nas características da formação da família brasileira. De modo particular, a violência configura-se como uma das principais preocupações da sociedade brasileira, sobretudo em relação aos jovens e adolescentes, que têm sido brutalmente exterminados, sobretudo pelos homicídios, em especial a juventude negra, e pelos acidentes de trânsito. Há que se ressaltar, que a sociedade em geral ainda trata com certa restrição alguns temas que são importantes no diálogo com os adolescentes, principalmente àqueles relativos a sexualidade e a afetividade. Nessa concepção, é preciso desenvolver estratégias e ações que promovam os direitos e a participação decorrentes da cidadania nos grupos sociais específicos. O Ministério da Saúde propõe diversas ações e programas direcionados aos jovens e adolescentes, tendo como principais eixos de trabalho o cuidado e atenção ao crescimento e desenvolvimento, a saúde sexual e reprodutiva e, por fim, a redução da mortalidade que ocorrem por intermédio dos acidentes e dos homicídios. Nesse sentido, a Atenção Básica adquire papel estratégico na proposição do SUS de reordenar o modelo de atenção, aproximando os serviços de saúde da população. Desse modo, uma Unidade de Saúde da Família (USF), situada no município de Vitória-ES, buscou fomentar, no ano de 2011, parcerias com grupos e instituições que trabalhassem com adolescentes dentro do território de abrangência, uma vez que a formação de um grupo destinado ao trabalho com adolescentes estritamente vinculados a USF dificultaria a aproximação com outros espaços da comunidade, fragmentando o atendimento. Logo, alguns profissionais da USF fizeram um levantamento das instituições e dos espaços destinados aos adolescentes em seu território de saúde. Assim, em um primeiro momento, um vínculo fora estabelecido entre a unidade e uma Organização Não Governamental (ONG) ligada a igreja católica, situado na periferia da cidade de Vitória-ES, onde há um grupo de adolescentes, do sexo feminino, que se reúne semanalmente às quartas-feiras. Essa região carrega as marcas de possuir o menor IDH do Município, onde o analfabetismo, o desemprego ou empregos informais, moradias insalubres, pontos viciados de lixo, ação do tráfico de drogas e gravidez na adolescência, são alguns dos seus desafios. Nesse sentido, uma equipe multidisciplinar da USF, formada por um enfermeiro, uma assistente social, agentes comunitários de Saúde, uma auxiliar de enfermagem e uma sanitarista, pactuou um encontro mensal com as adolescentes, no auditório da unidade, abordando temas como planejamento familiar, autocuidado, projeto de vida, violência, cidadania, uso e abuso de álcool e outras drogas, família e gravidez na adolescência. A metodologia utilizada nestes espaços é a da Educação Popular, baseada na proposta de Paulo Freire. Através da arte, técnicas de grupo, músicas, pinturas e movimentos corporais, buscou-se promover a reflexão crítica com as adolescentes, de modo a trabalhar questões que fizessem parte do cotidiano das participantes do grupo, com o objetivo de tornar o diálogo possível acerca de situações que não são devidamente debatidas. Embora a média de adolescentes que compareciam aos encontros fosse pequena, em torno de 08 a 13 meninas, as participantes avaliaram a proposta como positiva, afirmando que puderam, de fato, conhecer o funcionamento do serviço, opondo-se a imagem negativa que faziam até então. Com o intuito de desenvolver a reflexão crítica-cidadã, a experiência favoreceu a aproximação entre o serviço de saúde e a comunidade, sobretudo no que tange ao contato com os adolescentes, público ainda distante das unidades. Outro fator a se destacar, foi a sensibilização feita aos demais profissionais da USF, que perceberam a necessidade de ampliar seus olhares para o cuidado com os adolescentes, já que estes começaram a comparecer com maior freqüência na unidade de saúde. Logo, após a avaliação positiva com relação ao trabalho desempenhado, outros profissionais foram inseridos nesse processo, de modo a fomentar a articulação e possibilitar parcerias com outros grupos de adolescentes da comunidade, com vistas a formação de uma rede de proteção a este público, num projeto mais ambicioso e futuro. Desse modo, faz-se urgente a necessidade em romper com os muros que impedem uma ação intersetorial plena. A formação de indivíduos saudáveis exige uma atitude dialógica entre serviço de saúde e comunidade, e os desafios postos, como gravidez na adolescência, evasão escolar e violência, necessitam de grande esforço intersetorial para serem enfrentados. A articulação intersetorial torna-se fundamental a medida que os serviços e instituições tornam-se impotentes frente aos desafios postos por uma sociedade excludente, marcada pelo individualismo, pelo preconceito e pela falta de cuidado com os jovens e adolescentes, que muitas vezes vêem seus direitos básicos a educação, saúde, emprego digno, moradia, segurança esporte e lazer serem tolhidos. É de extrema importância que os profissionais de saúde, sobretudo os que atuam na Atenção Básica, que estejam atentos ao modo de ser e estar no mundo dos adolescentes, identificando suas principais necessidades, mas também descobrindo elementos que sirvam como fatores de proteção na busca pela saúde integral dos jovens e dos adolescentes. Logo, ir ao encontro dos adolescentes torna-se um desafio imperioso para os serviços de saúde, cujo norte orienta-se pela construção da cidadania.