Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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As diversas demandas no matriciamento de toxicômanos
Leonardo Bastos Velasco, Aline Pamela Santiago, Avner Shimon Goldblum, Priscilla Borelli Tavares

Resumo


Este trabalho é vinculado ao projeto PET-SAÚDE MENTAL – UFRJ ”ATENÇÃO INTEGRAL AO USO PREJUDICIAL DE DROGAS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: FORMAÇÃO E PRODUÇÃO DO CUIDADO”, desenvolvido pelo Instituto de Psiquiatria e pela Escola de Serviço Social. O projeto tem por objetivo promover a integração ensino-serviço-pesquisa no campo da saúde mental, em particular na atenção psicossocial em saúde mental, crack, álcool e outras drogas, por meio da análise do percurso de construção das ações de cuidado orientadas à atenção para usuários de álcool e drogas na cidade do Rio de Janeiro. Neste contexto reconhece-se a importância da articulação entre os dispositivos de saúde mental e a atenção básica, articulação que propõe a lógica do matriciamento dos casos acompanhados por ambas as equipes. A parceria entre atenção primária e saúde mental cresce cada vez mais com a expansão da cobertura de equipes de saúde da família nos diversos territórios dos quais, em sua maioria, são historicamente atravessados por prática de segregação e exclusão por parte do Estado. O equipamento de saúde estudado no caso reflete essa situação: Trata-se de um Centro de Atenção Psicossocial do tipo III que se localiza na região do Complexo do Alemão - conjunto de favelas situado na Zona Norte do Rio de Janeiro. O apoio matricial em saúde, segundo Campos (2007: 400) “objetiva assegurar retaguarda especializada a equipes e profissionais encarregados da atenção a problemas de saúde.” ou ainda “Matriciamento ou Apoio Matricial é um novo modo de produzir saúde em que duas ou mais equipes, num processo de construção compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica.” (BRASIL, 14 : 2011) Por outra via, segundo Lancetti (2009: 51), “nessa articulação entre as Estrategia de Saúde da Família e a saúde mental, a clínica é operada onde os protocolos conhecidos já fracassaram, como no caso da drogadição ou de violência familiar e comunitária”. Em linhas gerais, o apoio matricial torna-se uma ação que participa de maneira original na atenção integral em saúde, colocando novos desafios para a clínica dos transtornos mentais graves e/ou da toxicomania, como será nosso caso estudado. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é investigar que problemas e demandas de cuidado relacionados ao uso prejudicial de drogas aparecem no matriciamento do CAPS III João Ferreira da Silva Filho. A metodologia utilizada será a utilização do banco de dados dos casos acompanhados pelo CAPS III João Ferreira e dos registros no livro-ata das reuniões com as equipes de matriciamento a ele referidas, além do material oriundo de entrevistas semi-estruturadas com os matriciadores. Constatou-se não somente pelas entrevistas como na análise dos dados escritos que os casos de uso abusivo de álcool e outras drogas não chegavam pela via do matriciamento, mas através de demanda espontânea. Verificou-se que a maioria dos casos vindos pelo apoio matricial caracterizava algum tipo de transtorno mental grave e persistente, como a psicose. Nesse aspecto, durante as entrevistas apareceram alguns motivos para esse fato: Dificuldade de diferenciar a sintomatologia produtiva da psicose dos efeitos sintomáticos devido ao uso abusivo de álcool e outras drogas, a dificuldade de abordagem com os casos de toxicomania, a qual por sua vez, segundo as entrevistas, reflete um processo de estigmatização e certa postura hesitante perante esses casos ainda a ser estudado. A importância do matriciamento também vale pelo seu caráter de ampliação da assistência da saúde mental em lugares que possuem históricos de desassistência pelo Estado, servindo como mais uma porta de entrada na saúde, já que a equipe de saúde da família está mais próxima da comunidade e se torna estratégica para enfrentar as diversas formas de sofrimento psíquico. Um dos principais benefícios do matriciamento em relação ao uso abusivo de drogas e em relação a saúde mental é poder propiciar a instrumentalização e capacitação no manejo das equipes de ESF, enriquecendo as discussões sobre o tema; dividindo a responsabilidade em relação a alguns casos e, conseqüentemente, dando segurança a essas equipes em trabalhar com estes pacientes. A abordagem sobre o tema com os agentes comunitários dessas equipes é extremamente importante, já que estes se encontram dentro do território em que se trabalha e acompanham de perto estes usuários da rede de saúde. A partir do momento que estes se apropriam do tema, deixam alguns receios e ficam mais perceptivos aos casos em questão que ainda não chegaram a rede. Principalmente no que se refere as drogas licitas, que muitas vezes fazem parte de uma rotina dentro da comunidade, o tema é visto de forma naturalizada e não se coloca as possíveis patologias que um uso abusivo desta pode provocar, neste caso, o matriciamento se coloca com um papel importante para orientar o manejo com estes casos além de um possível tratamento caso o paciente se mostre solicito; sendo assim, aumenta a possibilidade de acesso . “Mas o fato da gente oferecer a figura de uma matriciador nas equipes de Saúde da Família, você vê que já tem umas equipes que já se organizaram com algumas atividades relacionadas ao acolhimento de dependentes químicos, enfim, usuários de álcool e outras drogas. Então a gente tem uma experiência bacana aqui na ESF que tem uma equipe que tem uma médica que por conta do vinculo importante já com o matriciador do CAPS, já se sente totalmente autorizado a desenvolver um grupo de escuta a alcoolistas.(...) , a partir do matriciamento a gente já tem experiências de que as pessoas são recebidas normalmente na atenção básica ou na UPA. Eu atribuo isso ao matriciamento também. ” Ainda assim, verificou-se que há pouca integração da Estrategia de Saúde da Família com o dispositivo de saúde mental, reduzindo-se estas situações à procura de auxílio em função dos casos que demandam maior urgência no cuidado. Dessa forma conclui-se a necessidade de ampliar e solidificar esta integração entre os serviços de saúde mental e Atenção Básica uma vez que “quando a Atenção Básica não é bem estruturada e não é reconhecida como estratégica, acaba ganhando força a lógica hospitalocêntrica, em que o cidadão estabelece relação direta com o hospital.” (BRASIL, 2009: 15). Portanto, a equipe matricial deve-se ver implicado com esse problema tão caro à saúde mental a qual possui um histórico de desinstitucionalização e de ampliação do escopo de ações primárias. Referências Bibliográficas: CAMPOS, G. W. S.; DOMITTI, A. C. Apoio Matricial e Equipe de Referência: uma metodologia para gestão do trabalho interdisciplinar em saúde. Cadernos de Saúde Pública (FIOCRUZ), v. 23, p. 399-408, 2007.DIMENSTEIN, M. . O desafio da política de saúde mental: a (re)inserção social dos portadores de transtornos mentais. Mental (Barbacena), Barbacena/MG, v. 4, n. 6, p. 69-83, 2006.DIMENSTEIN, M. ; SEVERO, A.; BRITO, Monique ; Ana Lícia Soares ; MEDEIROS, V. A. B. ;BEZERRA, E. N. R. O Apoio Matricial em Unidades de Saúde da Família: experimentando inovações em Saúde Mental. Saúde e Sociedade (USP. Impresso), v. 18, p. 63-74, 2009.LANCETTI, A. Clínica Peripatética. São Paulo: Hucitec, 2008.Ministério da Saúde. Guia Prático de Matriciamento em Saúde Mental, 2011.PORTARIA GM Nº 154, DE 24 DE JANEIRO DE 2008. PACTO PELA SAÚDE, 2009. http: //portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/Pacto_pela_saude_possib_realidade_2ed.pdf