Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E O ACESSO LIVRE À INFORMAÇÃO CIENTÍFICA EM SAÚDE SOBRE AS DOENÇAS NEGLIGENCIADAS: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO
Ilma Horst Noronha

Resumo


Comunicação OralO presente trabalho discute o acesso à informação científica em doenças negligenciadas no âmbito da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) na perspectiva do Movimento do Acesso Livre.O objetivo do estudo consistiu em apontar a necessidade de maior reflexão com vistas a embasar o desenvolvimento de ações de um amplo programa, coordenado e colaborativo, no âmbito da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), nos marcos de uma política brasileira em favor da ampliação da visibilidade da informação científica em saúde pelo livre acesso, com destaque em “Doenças Negligenciadas”.Mais especificamente, pretendeu-se oferecer elementos que pudessem contribuir para o fortalecimento da adesão da Fiocruz a iniciativas relevantes em prol do acesso livre à informação em Ciência e Tecnologia em Saúde (C&TS).Assim, a pergunta formulada no projeto foi: quais seriam os obstáculos e aspectos favoráveis à elaboração e desenvolvimento de uma política pública de acesso livre à informação científica no âmbito das doenças negligenciadas, em especial na Fiocruz?Para respondê-la, buscou-se identificar, em caráter exploratório, indicações presentes na literatura e na realidade empírica alvo desta pesquisa, que pudessem apoiar e mesmo sustentar a proposição de uma política pública de acesso livre à informação científica na saúde, no âmbito da Fiocruz, objetivo do presente estudo.Dentre os argumentos que justificam o livre acesso à informação científica, Ortellado (2008, p.186) inclui o vínculo com os valores científicos ou o ethos acadêmico do “comunismo dos resultados”, ou seja, a compreensão da informação e do conhecimento como “bem comum” a ser compartilhado como patrimônio da humanidade.No caso da saúde pública brasileira, o compartilhamento dos resultados das pesquisas desenvolvidas no país sobre as doenças negligenciadas torna-se ainda mais premente, devido aos riscos do ressurgimento dessas doenças e do surgimento de doenças novas. Neste sentido não se pode desprezar as conseqüências de falhas na comunicação científica, causada pela restrição do acesso à informação científica sobre tais doenças.Para comprovar a importância de se publicar em acesso livre, Machado (2005), utilizando os dados levantados por Brody (2004), na base do Institute for Scientific Information (ISI), elabora um quadro comparativo do percentual de impacto entre os artigos de acesso livre versus aqueles de acesso restrito. O resultado comprova que na área Biomédica a diferença de impacto pelo acesso livre é da ordem de 218% e na área da História supera a ordem de 1000%, o que demonstra a ampliação da visibilidade dos artigos disponíveis livremente na Internet e a custos infinitamente menores. Nesse sentido, Swan (2008) acentua a oportunidade e a necessidade de adoção da política de acesso livre no Brasil, relatando a expectativa de gestores, financiadores e dos próprios pesquisadores com a realização da pesquisa no ambiente de livre acesso e compartilhamento da informação e do conhecimento.Autores como Costa (2006) e Machado (2005) constatam que apesar do discurso em defesa do livre acesso, na prática este movimento no Brasil ainda não alcançou a amplitude esperada. Machado (2005) relaciona dentre os motivos que justificam a baixa adesão da comunidade científica brasileira ao acesso aberto, a falta de informação dos pesquisadores sobre o funcionamento das estratégias do acesso livre e a ausência de apoio institucional.Diante dos desafios da comunicação científica sobre as doenças negligenciadas em especial, apresentou-se como de interesse para a pesquisa colher e apresentar a visão e a posição dos gestores e pesquisadores da Fiocruz (mediante uma amostra tomada como representativa destes segmentos) a respeito da possibilidade de adesão, por parte da instituição, a iniciativas ligadas ao acesso livre à informação científica e tecnológica.Buscou-se a partir das falas dos atores-chaves da Fiocruz, campo empírico da pesquisa, revelar a visão e a posição dos mesmos sobre políticas de acesso livre à informação científica em saúde para identificar as possibilidades de adesão às premissas do movimento pelo acesso livre, considerando, ainda, se e como identificam o repositório institucional como dispositivo para viabilizar tais políticas.Embora pela fala dos entrevistados, a adesão ao acesso livre tenha sido confirmada unanimemente, uma vez que a acessibilidade e a publicidade são aspectos muito valorizados pelos atores, é importante esclarecer que os dados da pesquisa mostraram que a maior parte dos pesquisadores entrevistados, embora já tenham ouvido falar do acesso livre, desconhecem (ou pouco conhecem) o seu modo de funcionamento, bem como os resultados alcançados pelos pesquisadores que adotam esta nova forma de livre publicação.Seja pela literatura consultada ou pela fala dos gestores e pesquisadores ouvidos, esta pesquisa permite apontar que os dirigentes das instituições brasileiras de Ciência e Tecnologia em Saúde e os pesquisadores em doenças negligenciadas, se não aderiram inteiramente ao novo modo livre de publicação dos resultados de suas pesquisas, mostram-se favoráveis a uma política de acesso livre à informação científica.Observou-se que os argumentos apresentados pelos pesquisadores para a manutenção ou convivência com o modo atual de publicação, justificado por alguns dos entrevistados como problemas culturais, podem ligar-se, na maioria dos casos, à ausência de conhecimento mais aprofundado sobre as experiências bem sucedidas registradas na literatura acerca da publicação em acesso livre. Tais argumentos podem também ser explicados pelo fato de a mudança para um novo modo de publicação ser muito recente, encontrando-se ainda em fase de legitimação pela comunidade científica brasileira e mesmo internacional. A alegação da questão cultural foi apontada pela maioria dos ouvidos e deve ser absolutamente considerada quando da formulação de políticas de acesso livre em geral, e da Fiocruz em particular. No âmbito dessa instituição, algumas falas mostraram amplas possibilidades de buscar-se maneiras de enfrentar as barreiras culturais identificadas.Neste sentido, julga-se oportuno que tanto os gestores quanto os pesquisadores brasileiros realizem um exame cuidadoso acerca dos fatores que contribuem para a situação atual da comunicação científica nos países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. Preconiza-se também que sejam avaliadas as potencialidades do acesso livre e que se avalie as possibilidades de promoção de uma ruptura gradual com o modelo vigente de comunicação científica criando, assim, as condições necessárias para o salto da ciência para a inovação, pela legitimação de um novo contrato social da ciência, que tenha como princípio o acesso livre à informação científica.