Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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A REALIDADE DO SUS NA FORMAÇÃO EM SAÚDE: um relato de experiência
Karina Cordeiro de Jesus, Camila Gomes de Souza Andrade, Dandara Jesus dos Santos, Jéssica Nogueira Santos

Resumo


A formação em saúde tem privilegiado os aspectos biológicos e técnicos, desconsiderando, muitas vezes, o papel de agente transformador dos futuros profissionais, principalmente quanto à atuação dos mesmos no Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo Ceccim et al (2004), a formação dos profissionais de saúde deve ser implementada com um projeto educativo que extrapola a educação para o domínio técnico-científico da profissão e se estende pelos aspectos estruturantes de relações e de práticas em todos os componentes de interesse ou relevância social que contribuam para à elevação da qualidade de saúde da população, tanto no enfrentamento dos aspectos epidemiológicos do processo saúde-doença, quanto nos aspectos de organização da gestão setorial e estruturação do cuidado à saúde. Constata-se uma enorme defasagem entre o ensino e a realidade observada nos serviços de saúde, resultante do modelo educacional pautado em valores oriundos do modelo biomédico/flexeriano e da desarticulação do ensino com os princípios e diretrizes do SUS. O sistema necessita que o profissional seja dotado de uma compreensão abrangente da problemática de saúde nas sociedades contemporâneas, do processo de trabalho e relações. Este tem assumido papel ativo na reorientação das estratégias e modos de cuidar, tratar e acompanhar a saúde individual e coletiva, sendo capaz de provocar importantes repercussões nas estratégias e modos de ensinar e aprender (CECCIM ET AL, 2004). Nesse contexto, o Estágio de Vivência no SUS: o cotidiano no SUS enquanto princípio educativo configura-se como uma importante estratégia de reorientação da formação profissional em saúde. Segundo Fernandes et al (2011), esta iniciativa aliada ao fortalecimento e ampliação dos processos de mudança da graduação e da construção de novos compromissos entre as instituições de ensino, os serviços e movimentos sociais com o surgimento de novos atores sociais podem orientar novas práticas pedagógicas em consonância com as necessidades do Sistema Único de Saúde. O presente estudo trata-se de um relato de experiência referente à 4ª Edição do Estágio de Vivência no SUS (EVSUS) realizado no estado da Bahia, descrita a partir da visão e da observação livre de um grupo de estudantes de diversos cursos da área de saúde. O EVSUS-BA está em sua quarta edição e é fruto de uma parceria entre a Escola Estadual de Saúde Pública e a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia. Nessa proposta, cada estudante é considerado um sujeito em seu processo de ensino-aprendizagem, tendo a oportunidade de vivenciar a realidade do SUS em diferentes espaços e sob diversas óticas. De acordo com Ceccim et al (2004), a estratégia de trabalho interdisciplinar e multiprofissional favorece o compromisso e a responsabilidade dos futuros profissionais com as necessidades dos usuários do SUS, possibilitando a prestação de serviços, a produção de conhecimento, assim como o trabalho em equipe. Os estudantes selecionados nesta edição foram distribuídos em 28 municípios, formando-se 35 grupos multiprofissionais que foram acompanhados por Mediadores de Aprendizagem devidamente capacitados para contribuir com a construção dos saberes. O cenário deste estudo foi um município com aproximadamente 30 mil habitantes, localizado no centro-sul do estado e a vivência ocorreu durante 10 dias do mês de dezembro de 2011. Ao experimentar o cotidiano de trabalho nos serviços de saúde, durante os 10 dias, pudemos discutir e construir uma análise mais profunda, crítica e reflexiva acerca do SUS, das políticas de saúde, modelos de atenção e, ainda repensar sobre aspectos embutidos na nossa formação, garantindo um destaque para participação social. A oportunidade de ouvir e refletir a opinião do colega, que em muitos momentos vem de outro curso, de outra realidade institucional contribui na construção coletiva, e interdisciplinar sobre saúde, ao ampliar o horizonte do seu significado e as possibilidades de condução dos processos de saúde-doença pelos futuros profissionais. É na visitação, no registro das atividades, na experiência diária que vai surgindo o compromisso por uma saúde melhor, pois não tem como observar a realidade de saúde do município, e não pensar nas possibilidades de como contribuir para sua melhoria. Apesar do EVSUS se configurar como um importante dispositivo para a reorientação da formação dos trabalhadores em saúde, muito ainda precisa ser feito para que a formação desses profissionais seja coerente com as necessidades do SUS, reforçando a idéia trazida por Ceccim & Feuerwerker (2004), sobre a integração ensino – serviço – gestão – controle social. Cabe a universidade continuar investindo na formação dos estudantes fornecendo um embasamento ampliado sobre o sistema, correlacionando teoria e prática; propondo atividades que mostrem o seu funcionamento e como deve ocorrer a interação entre os níveis de atenção e a participação popular na saúde; além de possibilitar espaços de discussões, com uma metodologia diferenciada, que estimule a reflexão e problematização dos fatos, estimulando nós, estudantes, a querermos construir um sistema de saúde capaz de promover saúde através da consolidação dos seus princípios e diretrizes nas práticas. Baseado no cotidiano e nas experiências dos serviços de saúde no município visitado foi possível observar a necessidade de ter habilidade para lidar com aspectos que extrapolam o mecanicismo do sistema, ponderando variáveis sociais, políticas e econômicas, assim como a capacidade de transformação de um trabalho em equipe pautado na interdisciplinaridade e comprometimento, estabelecendo um sistema fundamentado nos princípios preconizados pelo SUS, sistema universal, e regido pela legislação. Observa-se a necessidade de um profissional de saúde dotado de compreensão abrangente da problemática de saúde na sociedade brasileira e suas peculiaridades locais, para que o mesmo possa atuar de modo coerente, consciente e comprometido com as necessidades de saúde da população. O EVSUS-BA constitui um dispositivo que permite que o estudante compreenda a importância do binômio ensino-realidade do SUS, além criar espaços de interação de diversas áreas do saber. Proporciona um intercâmbio mútuo, demonstrando o papel essencial do trabalho em equipe interdisciplinar, considerando o conjunto complexo e amplo das ações de saúde e seus determinantes que impactam no êxito da rede de serviços ao repensar a formação em saúde. Referências: [1] CECCIM, R. B.; FEUERWERKE, L. C. M. O Quadrilátero da Formação para a Área da Saúde: Ensino, Gestão, Atenção e Controle Social. PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 14(1): 41- 65, 2004. [2] FERNANDES, A. G.; BARRETO, A. A. A.; LIMA, D. L.; AMORIM, E. M.; LEAL, M. B.; VASCONCELLOS, S. C. Estágio de Vivência no SUS- Bahia: manual do mediador de aprendizagem/ Aline Gomes Fernandes e outros. 3.ed.rev.ampl. Salvador: SESAB/EESP, 2011.