Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


Tamanho da fonte: 
COMPREENDENDO O PROCESSO DA MATERNIDADE EM ADOLESCENTES ABRIGADAS: uma contribuição da Enfermagem
Beatriz Yuan Soares, Lucia Helena Garcia Penna, Joana Iabrudi Carinhanha, Gleice da Silva Fernandes

Resumo


INTRODUÇÃO As adolescentes em situação de rua possuem sua visão própria acerca de variados temas relacionados à saúde. Muitas vezes esta visão vai de encontro às teorias cientificamente embasadas, porém, ao observamos cuidadosamente, vemos que existe uma lógica implícita em suas falas. Isto significa que precisamos apreender delas o conhecimento que detêm sobre o mundo e a realidade na qual estão inseridas, abrindo possibilidade para a proposição, elaboração e sistematização de práticas educativas em saúde e assistenciais que busquem a real identificação com a adolescente em suas diversas facetas. Por este motivo, o estudo baseia-se na teoria dialógica de Paulo Freire para a construção de ações educativas com vistas à promoção de autonomia e auto-conhecimento em saúde pelas adolescentes abrigadas. OBJETIVOS Esta pesquisa trata da educação popular em saúde, principalmente sexual e reprodutiva, direcionada para mães adolescentes em situação de desafiliação, e apresenta como objetivos: descrever e discutir a avaliação das mães adolescentes abrigadas sobre as suas necessidades em relação ao seu processo de maternidade, e elaborar propostas de educação em saúde para o atendimento a essas necessidades. O trabalho justifica-se diante da escassez de material existente que aborde a questão da gravidez em adolescentes abrigadas no Brasil, bem como propostas que visem a melhoria da assistência prestada a estes indivíduos, o que pode ser constatado na literatura, a qual indica que, embora as famílias de adolescentes com filhos seja uma das subpopulações em situação de rua que mais cresce, relativamente poucos estudos têm focalizado a gravidez ou a paternidade entre adolescentes sem-teto. Visamos, com este estudo, possibilitar uma melhoria na qualidade de vida destas jovens, promovendo um maior auto-conhecimento no que concerne à saúde. METODOLOGIA O presente trabalho consiste em uma pesquisa exploratória, sendo desenvolvida na abordagem qualitativa. Para a coleta dos dados, foram utilizados relatórios construídos por acadêmicos cursando o sexto período da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a fim de levantar as necessidades de mães adolescentes abrigadas em relação à maternidade. Estes relatórios foram produzidos através da prática de ensino no campo, com supervisão de docentes da subárea de Saúde da Mulher. Para apreciação dos dados coletados, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo, que, de acordo com Bardin, se define como “um conjunto de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Os dados, portanto, foram analisados numa discussão contextual da realidade, procurando o significado real da fala dos atores sociais e a sua relação com o seu contexto histórico, social e qualitativo em sua totalidade. A partir do resultado da análise dos dados produzidos, foram elaboradas propostas educativas, para o desenvolvimento de ações nos dispositivos de abrigamento para jovens mães. Estas propostas educativas têm como tema central a saúde sexual e reprodutiva, e a maternidade para a adolescente abrigada. Estas estratégias foram construídas a partir da compreensão da ação dialógica do cuidar (método freireano). RESULTADOS A partir da análise dos dados apresentados nos relatórios dos acadêmicos de Enfermagem, as necessidades encontradas foram divididas em dois grupos: necessidades de melhoria da infra-estrutura e necessidades de trabalho com as adolescentes. No que diz respeito à infra-estrutura, destacaram-se as necessidades de manutenção do espaço físico da unidade de abrigamento, proporcionando assim melhores condições de moradia às jovens abrigadas, além da demanda de apoio à saúde mental dos educadores envolvidos no processo de cuidado das adolescentes. Já no que concerne ao trabalho a ser realizado com as jovens mães, encontrou-se necessidade de realização de atividades de lazer e ações educativas voltadas para as adolescentes, abordando as seguintes temáticas: sexualidade, com destaque para a as questões da homossexualidade e da visão sobre o próprio corpo; violência; questões de saúde sexual e reprodutiva, tais como gravidez na adolescência, métodos contraceptivos, alterações no corpo feminino durante a gestação e amamentação. Além disso, foi considerado como imperativo orientar as jovens acerca dos seus medos, anseios e dúvidas relacionados a qualquer temática, bem como sobre a construção de projetos de vida e aproveitamento de oportunidades oferecidas pelo próprio abrigo. Viu-se também como necessário atentar para a valorização do ponto de vista das adolescentes, descobrir os motivos que levam ao sentimento de não-inclusão das mesmas, e trabalhar com foco na auto-imagem, visando o aumento da auto-estima. O vínculo entre adolescente e profissional também foi uma questão indicada como de grande relevância, e que precisa de estímulo. A figura do educador mostrou-se como importante, de forma que suas opiniões devem ser valorizadas na construção das estratégias para ações educativas. A partir da discussão destes dados, as propostas de ações educativas elaboradas focaram a utilização de algumas estratégias, tais como: ludicidade, dramatização, exibição de vídeos e a técnica de inversão de papéis entre educadores e educandos, considerando o perfil das adolescentes, as temáticas a serem abordadas e a teoria dialógica desenvolvida por Paulo Freire. CONCLUSÃO As mães adolescentes desafiliadas apresentam importantes necessidades de saúde, demandando apoio dos profissionais envolvidos, o qual deve se estruturar com bases na educação em saúde, com uso de técnicas dialógicas para promoção do auto-cuidado das jovens. Acreditamos que, a partir da análise de tais necessidades e da construção de propostas de ações educativas, podemos realizar, em parceria com adolescentes e profissionais de abrigo, atividades que atendam a esta demanda e promovam uma melhora na qualidade de vida deste grupo populacional que se encontra em situação de extrema vulnerabilidade. Apesar da valorização das ações educativas pelas políticas de saúde nos últimos anos, a aplicação de tais atividades ainda apresenta restrições devido à existência de pouca produção científica a respeito, e à baixa adesão dos profissionais ao ideal da atenção primária e educação em saúde. Necessita-se de mais trabalhos científicos que debrucem-se sobre as questões biopsicossociais que permeiam o cotidiano da população em situação de rua, com destaque para as adolescentes desafiliadas e sua saúde sexual e reprodutiva. Também mostra-se imprescindível um trabalho de extensão com vistas a testar na prática as idéias elaboradas nesta pesquisa.