Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO DE AÇÕES INTERSETORIAIS EM MUNICÍPIOS DE PEQUENO PORTE
Livia Angeli Silva, Cezar Augusto Casotti

Resumo


A cobertura de serviços de atenção primária é essencial para a reestruturação e efetivação das ações em saúde. Todavia diante da complexidade do processo saúde-doença, verifica-se que para atender às reais necessidades da população faz-se necessário implementar ações intersetoriais, como forma de enfrentar os determinantes sociais, e assim, efetivar a promoção da saúde. A Estratégia de Saúde da Família (ESF), em tese, tem como atributo potencializar essas ações através do melhor conhecimento das necessidades de saúde em cada território. Mas também se destaca que a efetivação dessas ações somente é satisfatória quando além das dimensões técnico-assistenciais desenvolvidas no âmbito da ESF, também se consolidem mudanças nas dimensões organizacionais e político-institucionais1, ou seja, no âmbito da gestão local. Este estudo objetivou analisar como são organizadas as ações intersetoriais em municípios de pequeno porte que possuem grau avançado de cobertura potencial da ESF. O trabalho aqui apresentado se constitui em um recorte de uma dissertação de mestrado que buscou avaliar o grau de implantação da ESF em municípios de pequeno porte. A pesquisa foi desenvolvida em dois municípios da 13ª Diretoria Regional de Saúde do Estado da Bahia, localizados na região do semi-árido. Os dados foram coletados por meio de entrevista semi-estruturada, observação sistematizada, análise documental e busca nas bases de dados do IBGE e DATASUS. Foram sujeitos do estudo os gestores e trabalhadores da ESF e as observações foram realizadas nos espaços de todas as Unidades de Saúde da Família (USF) desses municípios. Considerando os aspectos éticos definidos pelo Conselho Nacional de Saúde, o projeto teve aprovação do Comitê de Ética da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), os gestores dos municípios autorizaram a realização do estudo e todos os sujeitos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Verificou-se que os dois municípios apresentam baixos indicadores sociais como alta incidência de pobreza (50,8%, 47,8%), altas taxas de analfabetismo (37,7%, 35,2%) e ainda baixa taxa de acesso aos serviços de saneamento básico (55,9%, 30,7%), abastecimento de água (71,6%, 70,7%) e coleta de lixo (71,5%, 70,5%). Ainda foi observado, que mais de 50% das famílias sobrevivem com uma renda per capta inferior a meio salário mínimo e uma grande proporção delas são beneficiadas por programas de transferência de renda (56%, 47%). Os municípios também apresentam características sócio-demográficas que fogem ao padrão médio da Bahia e do Brasil, como por exemplo um alto percentual de população idosa e baias taxas de urbanização. Mesmo diante dessa realidade diversa, a implantação da ESF segue um modelo regionalizado2, seguindo uma proposta estadual que não reflete as particularidades desses municípios. Foram evidenciadas ações intersetoriais envolvendo as secretarias de Educação e Assistência Social tanto no nível da gestão, como no território de abrangência da ESF. As equipes desenvolvem atividades em escolas e grupos de idosos e adolescentes, alem de estabelecerem parcerias com o conselho tutelar e instituições religiosas. Entretanto, essas atividades ocorrem de forma esporádica e em situações e atividades específicas. Em um dos municípios foi encontrado uma maior institucionalização, vez que as demais secretarias participam da construção do plano municipal de saúde e neste foi verificado que as atividades desenvolvidas em conjunto apresentam maior continuidade. Mas de forma geral, nos dois municípios, as ações intersetoriais não consideram a situação local, tanto de saúde como sócio-demográfica, elas acabam por serem incluídas na programação com base no senso comum e nas propostas verticalizadas advindas de outra esfera de governo. Desta forma, o planejamento é frágil, pois não é feita uma análise da situação de saúde, as propostas de ações não apresentam uma relação direta com o diagnóstico da situação local, e consequentemente, não existe avaliação dessas ações. Percebe-se que mesmo havendo deficiência na lógica da realização da análise de situação de saúde nos municípios, de alguma forma a equipe busca alternativas para identificar os problemas. Todavia as soluções e formas de enfrentamento não vão além dos limites da unidade. Somente os Agentes Comunitários de Saúde que buscam soluções em outros âmbitos. A baixa capacidade de gestão tanto do setor saúde como dos demais setores governamentais é um dos fatores que dificultam a identificação dos determinantes sociais, bem como a elaboração de políticas no âmbito municipal para o enfrentamento dos mesmos. O discurso dos secretários de saúde, evidencia a necessidade de uma maior incorporação de conhecimentos e conceitos básicos, bem como práticas essenciais ao processo de trabalho da gestão e gerência que refletem nas ações diretas no território das USF. É explícito a apropriação insatisfatória dos conhecimentos acerca dos instrumentos de gestão, financiamento, níveis de atenção, níveis de prevenção, risco e enfrentamento dos determinantes sociais da saúde. Os gestores entendem que ao serem solucionados os problemas de acesso aos serviços de Média e Alta Complexidade, estariam resolvidos os problemas da gestão. Nos dois municípios evidenciou-se que a equipe técnica das Secretarias de Saúde é restrita, sendo constituída basicamente por profissionais com pouco tempo de formação. Quanto às equipes de trabalho na ESF, a maioria não possui qualificação específica no campo da saúde coletiva e a rotatividade dos profissionais é alta. Além da baixa capacitação dos gestores dos diferentes setores governamentais, eles ainda são poucos, o que significa que acumulam funções e responsabilidades que dificultam ainda mais a implementação de políticas melhor elaboradas. Um outro fator também relevante é a escassez de organizações não-governamentais, o que dificulta o estabelecimento de parcerias para ações mais efetivas voltadas à promoção da saúde. Mesmo diante de uma cobertura avançanda da ESF há uma década, as ações intersetoriais ainda são incipientes e não refletem as necessidades da população. Ainda se constituem em ações aleatórias e exporádicas, na maioria das vezes fruto de ações voluntárias e iniciativas individuais de profissionais, não sendo homogênea no município. Sendo assim, mesmo existindo indícios de algumas ações, por não serem sistematizadas, não tem conseguido modificar os indicadores sociais desses municípios que vem mantendo os mesmos padrões nesta última década. 1. Teixeira CF. A Mudança do Modelo de Atenção à Saúde no SUS: desatando nós, criando laços. In: Teixeira CF, Solla JP. Modelo de Atenção à Saúde: promoção, vigilância e saúde da família. Salvador: Edufba; 2006.2. Viana AL, Dal Poz MR. A Reforma do Sistema de Saúde no Brasil e o Programa de Saúde da Família. Physis Rev Saúde Coletiva 2005; 15: 225-64.