Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Direito à saúde: uma reflexão necessária
Márcia Valéria de Carvalho Monteiro, Erika Schreider

Resumo


A partir da década de 80, precisamente com a Constituição de 1988, a saúde passou a ser um direito universal devendo ser garantido pelo Estado. Este direito foi conquistado através de um processo de reivindicação e de lutas político-sociais, sobretudo, através do Movimento Sanitário.A partir destas lutas a saúde passou a ser reconhecida como resultado das condições de vida da população, tendo como fatores determinantes, os seguintes condicionantes: trabalho, renda, habitação, alimentação, saneamento básico, dentre outros.Desse modo, saúde não é apenas ausência de doença, mas é um processo resultante de várias determinações: político-sociais, culturais e econômicas. Todavia, apesar das conquistas consubstanciadas na Constituição de 1988, muitas problemáticas não foram superadas, sendo a saúde atravessada por uma série de questões limitantes e decorrentes do acirramento da política neoliberal tais como, precarização de recursos, ênfase na assistência medicamentosa e curativa, acirramento das mazelas sociais, dentre outros.Assistimos à contínua redução do valor real do salário da classe trabalhadora, a inserção precária no mercado de trabalho, a flexibilização desse mercado, o trabalhador polivalente e o desemprego estrutural, fatores que dentre outros, geram a pauperização cada vez mais acelerada dos trabalhadores, repercutindo nas suas condições de vida e saúde.Tais fatores, que constituem as expressões da questão social, podem ser ilustrados através de alguns dados estatísticos brasileiros com uma população economicamente ativa de 87,7 milhões foi verificado que mais de 50% deste universo recebem até dois salários mínimos. Segundo dados do PNAD (2003), 10% recebem até meio salário mínimo e 43,8% acima de meio salário até dois salários mínimos. A média dos salários em reais dos 40% mais pobres e dos 10% mais ricos é, respectivamente, R$ 185,27 e R$ 3.130,61 (PNAD, 2003). Ainda segundo a referida pesquisa temos uma demonstração explícita da extrema desigualdade social que assola o país: 15,5% da renda do país corresponde a 50% dos mais pobres e 12,7 % dessa renda é correspondente a 1% dos mais ricos da população brasileira.A entrada no Brasil da política neoliberal, seguindo as diretrizes do Consenso de Washington, nos coloca diante de traços conservadores no que é colocado como moderno, como privatizações, liberdade de mercado, retração do Estado, com amplas repercussões no âmbito dos direitos sociais. Estas questões associadas a nossa cultura de privatização do público, clientelista e patrimonialista, agrava ainda mais as expressões da questão social em nosso país. Neste cenário está presente uma reordenação do mercado de trabalho, fruto da chamada “reestruturação produtiva”. Esta teve origem nos países centrais e foi fruto de uma estratégia para superação da crise do capitalismo. De acordo com Antunes (1999), esta crise, no cenário internacional, tem seus traços mais evidentes no esgotamento do padrão taylorista/fordista de produção, na queda da taxa de lucro, na hipertrofia da esfera financeira, na maior concentração de capitais, na crise do Welfare State e no incremento acentuado das privatizações. O neoliberalismo e a reestruturação produtiva foram as respostas mais evidentes para superação da crise estrutural.No Brasil, especialmente a partir da década de 90, muitas decisões internas tiveram que passar pelas regulações econômicas internacionais, estabelecendo-se metas e critérios econômicos para as políticas sociais brasileiras. Estas foram redimensionadas, com tendências de privatização, de cortes nos gastos públicos para a esfera social, gerando a focalização no atendimento à pobreza. Este é um projeto de globalização econômica dominante, com pretensões universalistas. No discurso é disseminada a ideia que este projeto pode gerar benefícios para todas as nações que estejam subordinadas a ele. Dentro deste discurso todos os países “falariam a mesma linguagem” e seriam competitivos, visando à auto-regulação dos mercados, sem nenhum tipo de barreira, inclusive a alfandegária.Nesse contexto, não é possível vislumbrar a efetivação dos direitos inscritos na Constituição de 1988, que reconhece como responsabilidade do Estado a garantia dos direitos referentes à educação, à saúde, ao lazer, ao trabalho, etc. Entretanto, na “dança das palavras” a Lei vira letra morta.Assim, a população brasileira é afetada em várias determinações que correspondem à totalidade da vida social. Ocasionando, entre outras questões, a deteriorização da saúde da sociedade. Tendo em vista o reconhecimento de que saúde é um direito universal e um processo resultante de condições políticas e sócio-econômicas da população, o assistente social intervém nesta área tomando por base as dimensões técnico-operativa, ético-política e teórico-metodológica, com o objetivo de viabilizar o acesso aos direitos dos usuários, fazendo a mediação necessária entre a realidade destes e o processo de tratamento, intervindo na tensão existente entre a lei e a realidade, e atuando no sentido de contribuir para a defesa intransigente dos direitos da população usuária. . . , , É nesta perspectiva que o Serviço Social realiza estudos sócio-econômicos e orienta a população sobre o acesso aos serviços públicos, na busca pela viabilização dos seus direitos sociais, com a finalidade de minorar a precariedade das suas condições sociais, o que irá refletir direta ou indiretamente na condição de saúde do usuário e de seus familiares.O assistente social irá intervir com a finalidade de viabilizar o acesso aos direitos e aos meios exercê-los, tendo como centralidade as dimensões que possam interferir no processo de tratamento, criando obstáculos e/ou limites a sua realização e continuidade. Para tanto recomenda-se socializar as informações referentes aos direitos sociais, promover discussões coletivas em interface com o contexto sócio-econômico e cultural dos usuários, construir estratégias que possibilitem o exercício da participação e do controle social na perspectiva preconizada pelo SUS, bem como trabalhar no viés da integralidade dos serviços e intersetorialidade das políticas sociais, buscando consolidação e ampliação dos direitos sociais preconizados na Constituição de 1988.