Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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DISCUTINDO A SAÚDE DO HOMEM COM ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL NOTURNO EM VITÓRIA-ES
Poliana Lourenço Souza Silva, Roseane Vargas Rohr, Pamila Schmidt Tamanini

Resumo


A saúde do homem tem sido um tema pouco abordado nos serviços de saúde e sua complexidade vem despertando o interesse de diversos autores que, nos últimos anos, têm realizado algumas pesquisas envolvendo a temática. Vários estudos têm investigado a saúde reprodutiva do homem, motivados pela ausência desse grupo nas questões ligadas ao planejamento familiar, controle de DST/AIDS, sexualidade, valores, crenças e costumes, paternidade e identidade masculina. Entretanto as relações de gênero estabelecidas na sociedade atual definem novas configurações nas relações de poder e hierarquia, levando-nos a refletir sobre a relação homem-mulher-filhos, a inserção da mulher no mercado de trabalho, a sexualidade e saúde reprodutiva e as políticas de saúde, repensando a saúde do homem nesse novo contexto (GOMES, 2008). Dados epidemiológicos revelam maiores índices de mortalidade entre homens no Brasil, principalmente na faixa etária de 20 a 39 anos, sendo apontadas como principais causas, as doenças do aparelho circulatório e causas externas, evidenciando também a AIDS e alcoolismo como agravos importantes para a saúde masculina (LAURENTI; JORGE; GOTLIEB, 2005). Em seu estudo, Braz (2005) adverte que a sobremortalidade do homem vai além dos dados sobre violência e pressupõe que o aumento da mortalidade entre eles pode estar relacionado com a subjetividade masculina. Os comportamentos do homem e da mulher dependem de fatores socioculturais que podem gerar agravos específicos, que estão intimamente atrelados à questão de gênero. É comum a associação do homem com características de invulnerabilidade, força e virilidade, conflitando com a demonstração de sinais de fraqueza, medo, ansiedade, segurança representado pela procura ao serviço de saúde, o que colocaria em risco a sua saúde, por não adotarem comportamentos preventivos, nem tampouco procurarem os serviços de saúde (GOMES; NASCIMENTO, 2006; GOMES; NASCIMENTO; ARAÚJO, 2007). Ao escolhermos a saúde do homem como tema deste estudo tivemos a pretensão de colocá-lo como sujeito detentor de necessidades singulares, evidenciar a importância do princípio de equidade no atendimento em saúde. Considerando a escassez de trabalhos sobre o tema e o interesse em desvelar alguns aspectos sobre a saúde desse grupo, optamos por abordar a temática com o objetivo de levantar as necessidades de saúde do homem, bem como os fatores relacionados à acessibilidade desse grupo aos serviços de saúde. Trata-se de uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa tendo como sujeitos 36 estudantes do sexo masculino, matriculados no ensino fundamental noturno de uma escola pública localizada em Vitória-ES. Os dados foram produzidos em oficinas realizadas com grupo de sujeitos utilizando metodologias participativas, além de adotar a entrevista semi-estruturada e observação participante como técnica de produção dos dados. As questões norteadoras estimularam o diálogo entre os participantes sobre as necessidades de saúde do homem e o acesso aos serviços de saúde. Para análise dos resultados adotou-se a técnica de análise de conteúdo (Bardin, 2002). O projeto foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo, cumprindo todas as recomendações da resolução 196/96. Os resultados apontaram que os homens associaram o conceito de saúde a hábitos de vida como realização de atividade física, alimentação saudável, amor, alegria, cuidado de si, sexo, trabalho e dinheiro. A violência foi relacionada diretamente ao homem, correlacionando-a aos hábitos e atitudes masculinas com o crime, tráfico e consumo de drogas, resultando na maioria das vezes em violência e morte. O convívio com uma realidade de facilidades aparentes resulta no anseio por adquirir dinheiro fácil, sem considerar os riscos. O envolvimento com o crime pode ser visto como algo que gera vantagens, “dinheiro rápido”, “respeito”, “poder”, fazendo com que se sintam “mais homens”. Contudo, alguns participantes fizeram uma ressalva de que o meio nem sempre é determinante nas posições assumidas diante da vida, enfatizando a necessidade de se desenvolver valores éticos e morais, bem como a importância de se empreender objetivos na vida. Ao abordarem a questão sexual com grande ênfase, foi possível perceber um grande valor atribuído à sensualidade feminina e ao corpo da mulher como forma de obter prazer e satisfação. Os participantes deram relevância ao ato sexual pelo fato de sentirem-se bem, por esta ser uma fonte de prazer passível de ser conquistada. No entanto, este comportamento sexual quase compulsivo pode gerar riscos a saúde, não apenas de contrair doenças sexualmente transmissíveis mas também por deixarem de fazer uso de determinados medicamentos em função dos possíveis efeitos adversos na potência sexual. Por outro lado, fazem uso de componentes farmacêuticos e domésticos, sem as devidas orientações, na tentativa de aumentar o rendimento sexual, podendo comprometer a saúde. Quanto aos serviços de saúde o grupo demonstrou uma ausente relação, principalmente com a atenção primária. Tal fato nos remete a pensar na importância dos serviços se tornarem mais acessíveis a este público, que trabalha durante o dia e estuda à noite. Nesse sentido, as principais dificuldades apontadas foram relacionadas à indisponibilidade de tempo para procurar um atendimento no serviço de saúde, devido à carga horária de trabalho e estudo ser incompatível com o horário de atendimento dos serviços de saúde. O desconhecimento das leis que amparam o trabalhador foi demonstrado como fator impeditivo na busca por atendimento. O acolhimento, por sua vez, também foi um divisor de opiniões, pois enquanto alguns relataram sentir-se acolhidos pelos serviços de saúde, prevaleceu o número dos que se queixaram do atendimento. Apesar de criticarem, em geral, o Sistema Único de Saúde, não relataram diferenças na qualidade dos serviços em comparação ao sistema privado, apontando diferenças apenas no tempo de espera para o atendimento. Os resultados demonstram que para a promoção de saúde do homem são necessárias mudanças nos serviços de saúde, no atendimento prestado pelos profissionais de saúde, e na formulação de ações estratégicas voltadas para esse grupo. Evidencia-se a necessidade de ampliar as ações educativas em saúde na escola contemplando o horário noturno, considerando a realidade de muitos estudantes que trabalham e não encontram acolhimento nas unidades de saúde em função do horário de funcionamento. Percebemos a importância dos profissionais de saúde em buscar maior capacitação para realizarem atividades em grupo com os homens. Ao buscar um conhecimento a respeito do universo masculino os profissionais poderão abordar várias questões e, assim, promover educação em saúde, na tentativa de atingir a prevenção de agravos e de promover cidadania.