Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Perfil dos medicamentos das farmácias caseiras em Cornélio Procópio/PR, 2008
Alide Marina Biehl Ferraes, Larissa Ferres Joaquim

Resumo


No Brasil e em outros países tem-se observado na comunidade médica, na sociedade e entre os administradores públicos, o aumento da preocupação quanto ao uso racional de medicamentos como um dos pilares de políticas públicas de saúde. Os medicamentos são produtos preparados para auxiliar a manutenção da saúde em caso de necessidade. A Legislação Sanitária Brasileira, Lei 5991 de 17 de dezembro de 1973, conceitua medicamento como produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico. O uso incorreto pode levar a uma série de problemas, efeitos adversos e até mesmo a morte. Assim, o uso racional é extremamente importante no processo saúde-doença numa comunidade. A farmácia domiciliar, freqüentemente depositada em ambientes e recipientes inadequados, propicia diversas possibilidades de consumo irracional e desperdício. Esta prática de armazenar medicamentos em casa pode facilitar a automedicação não responsável, bem como o aumento do risco de exposições tóxicas não intencionais e intencionais. Pode causar inclusive o descarte incorreto de medicamentos da farmácia caseira. A automedicação, a utilização de medicamentos sem prescrição médica, e ter uma ”farmacinha” caseira são fatores que contribuem para o uso irracional de medicamentos. Neste estudo foi analisado o perfil dos medicamentos oriundos das farmácias caseiras, em Cornélio Procópio, no ano de 2008. Foi delineado um projeto de Recolhimento de Medicamentos e executado em três etapas, tendo como parceiros, a Vigilância Sanitária, a Faculdade Dom Bosco, o Conselho Municipal de Saúde, e o Conselho Regional de Farmácia do Paraná. Na primeira etapa a comunidade foi sensibilizada, por meio de palestras educativas sobre o uso racional de medicamentos e entrega de folder especialmente elaborado para o projeto. Na segunda etapa, com apoio da população com apoio da população, os medicamentos foram depositados em urnas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). As pessoas interessadas em participar do Projeto depositaram os medicamentos que estavam em suas casas e que não mais seriam utilizados. Foram solicitados medicamentos, tanto dentro do prazo de validade, quanto fora dele, e também àqueles que já tinham sido abertos e por algum motivo não foram consumidos totalmente. Para a coleta destes medicamentos foi estipulado um prazo de quatro meses. Após o preenchimento destas urnas, os medicamentos foram recolhidos e levados à Vigilância Sanitária Municipal. Na terceira etapa, os medicamentos foram encaminhados pela Vigilância Sanitária à Faculdade Dom Bosco para análise, parecer e posterior descarte apropriado. Foi submetido à Secretaria de Saúde do município, um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para dar início à análise dos medicamentos recolhidos. Como critério de coleta de dados para esta pesquisa, dentre os medicamentos recolhidos, foram utilizados somente formas farmacêuticas sólidas intactas (comprimidos, cápsulas e drágeas) e líquidas em frascos lacrados ou não (suspensões, soluções e xaropes) que fazem parte da lista de medicamentos essenciais do município. Este processo permitiu a análise comparativa. Para a classificação dos medicamentos, foram utilizados os critérios validade, forma farmacêutica, princípio ativo e classe farmacológica, seguindo-se as seguintes etapas: no critério validade, os medicamentos foram separados em vencidos (validade até 12/2008) ou não vencidos e colocados em duas caixas. Após esta primeira classificação, os medicamentos foram alocados pela forma farmacêutica em líquidos (suspensão, solução e xarope) e sólidos (comprimidos, cápsulas e drágeas), considerando a descrição de formas farmacêuticas estabelecido por Marin (2003). após a segunda classificação, os medicamentos foram separados pelo princípio ativo considerando a Denominação Comum Brasileira (DCB) e colocados cada um em um saco; cada saco foi identificado pelo princípio ativo. Após estas classificações, os medicamentos foram quantificados conforme o princípio ativo, a validade e classe farmacológica. Para a classe farmacológica foi considerada a classificação ATC estabelecida na RENAME de 2008. Os resultados foram analisados por meio de estatística descritiva. Foram encontrados 16.576 unidades de medicamentos sólidos e 79 unidades de medicamentos líquidos distribuídos em 23 classes farmacológicas para os sólidos, 11 classes farmacológicas para os líquidos, e a maioria (52%) fora do prazo de validade. Dentre os medicamentos sólidos, a classe farmacológica encontrada em maior quantidade foi dos anti-hipertensivos. Nesta classe (considerando tanto os medicamentos vencidos como os não vencidos), os princípios ativos mais encontrados foram captopril, atenol, enalapril e propranolol. Já na classe dos hipoglicemiantes, os mais encontrados foram metformina e glibenclamida e na classe dos diuréticos os encontrados foram hidroclorotiazida e furosemida. A classe farmacológica encontrada em quantidade menor foi dos ansiolíticos, possivelmente por esses medicamentos serem de controle especial (Portaria 344/98), e o acesso a eles é mais difícil. A maioria das classes de medicamentos encontrada dentro do prazo de validade foi de uso contínuo e para doenças crônicas. O tempo prolongado dos tratamentos e a não obtenção da cura, mas somente uma estabilidade no estado de saúde do paciente, podem favorecer o uso irracional desses medicamentos. Anti-hipertensivos (38%), diuréticos (16%) e antidisrítimicos (2,8%) foram as classes farmacológicas mais encontradas dentro do prazo de validade, e medicamentos usados no tratamento de doenças crônicas cardíacas e assintomáticas na maioria das vezes, como a hipertensão arterial sistêmica. Essas três classes farmacológicas são relevantes, reforçando a idéia de que a ausência de sintomas contribui de forma marcante para a não adesão, ou mesmo para o abandono do tratamento. O quantitativo de medicamentos e a variedade de grupos terapêuticos enumerados nesta pesquisa salientam a importância de investimentos no setor público, em programas objetivando reduzir desperdícios e o uso irracional de medicamentos. Considera-se importante sensibilizar e conscientizar as pessoas da gravidade da automedicação, do descarte correto, e da importância da orientação sobre o uso racional de medicamentos, sendo essencial neste aspecto, a atuação do farmacêutico. Ressalta-se neste contexto, que o contato direto entre farmacêutico e usuário, com orientação sobre uso correto e adequado de medicamentos, favorece tanto a adesão ao tratamento farmacológico, quanto estimula a aprendizagem e a mudança de atitude do paciente.