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Práticas Populares de Saúde em Comunidades de Quilombolas e Articulação com a Atenção Básica no Río de Janeiro
Resumo
A palavra quilombo expressa "acampamento, floresta, guerreiro e habitação”, e também lugar para estar com Deus. Os milhares de escravos que durante quase quatro séculos foram submetidos a uma tragédia sem limites, reconstruíram nos quilombos uma organização territorial africana, cuja função era diluir a violência gerada pela escravidão. O quilombo contemporâneo vincula estas comunidades com a resistência de uma cultura, que reclama seu direito a existir ainda que em condiciones adversas. As práticas tradicionais de saúde vêm sendo mantidas como parte da cultura destes povos e são também motivo de valor e orgulho. Pesquisa recente realizada por convênio firmado entre a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos – SEASDH e a Fundação Centro de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Estado do Rio de Janeiro – CEPERJ, em 2009 revela que o RJ podia quantificar na ocasião 24 comunidades quilombolas distribuídas em 12 municípios. Sabe-se que este número hoje é maior e que vários grupos vêm se organizando para dar visibilidade a novos quilombos neste Estado. Há urgência de políticas públicas para as populações quilombolas. De modo geral, a infraestrutura das comunidades quilombolas é precária. A insuficiência dos serviços públicos e políticas sociais específicas para essas populações agravam as condições de vida comunitária, desagregando os laços culturais. Em 2004 o Governo Federal lança o Programa Brasil Quilombola, sob coordenação da Secretaria Especial de Promoção e Política da Igualdade Racial (SEPPIR) que integra um conjunto de ações de vários órgãos federais para fazer valer os direitos das comunidades quilombolas. Melhorar as condições de vida e fortalecer a organização das comunidades remanescentes de quilombos por meio da promoção do acesso aos bens e serviços sociais necessários ao desenvolvimento, considerando os princípios sócio-culturais dessas comunidades, é o compromisso do governo federal. No que tange a Saúde o programa aponta a necessidade do desenvolvimento de programas específicos que garantam o bem-estar físico, psicológico e social, além da indispensável qualidade do sistema de saúde. O então Programa Saúde da Família (PSF) é a orientação geral no cumprimento desta necessidade. A Política Nacional de Gestão Estratégica e Participativa no SUS (ParticipaSUS, 2009, 2ed) , que tem como um dos seus princípios e diretrizes a promoção da inclusão social de populações específicas (incluídos os quilombolas), visando à equidade no exercício do direito à saúde, aponta o Programa Brasil Quilombola como uma das ações a serem desenvolvidas no âmbito da ParticipaSUS. Três aspectos são considerados aqui: 1) Promoção da equidade na atenção à saúde da população quilombola; 2) Estabelecimento do recorte racial na política da saúde, nos aspectos relacionados à organização e ao desenvolvimento institucional e suas variantes nos programas do SUS; 3) Atenção à saúde das populações quilombolas. Em02/12/2011 o MS lançou a Política Nacional de saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta que incluem ”as comunidades de quilombos” e que tem como um dos seus objetivos específicos a garantia do acesso aos serviços da atenção básica à alta complexidade, urgência e emergência, bem como a redução das vulnerabilidades em saúde das populações do campo e da floresta. Ainda no campo das políticas que dizem respeito a este trabalho temos que citar a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do MS, 03/05/ 2006, que cita o respeito aos conhecimentos tradicionais em fitoterapia e a recomendação da OMS para pesquisa e avaliação dos resultados terapêuticos das medicinas complementares e tradicionais. E ainda citar a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, 22/06/2006 , onde temos que a OMS reconhece que grande parte da população dos países em desenvolvimento depende da medicina tradicional para sua atenção primária, considerando que 80% desta população utilizam práticas tradicionais nos seus cuidados básicos de saúde e 85% destes utilizam plantas ou preparações destas. Em 2007, o governo federal institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, que reconhece o povos e comunidades tradicionais e estabelece que deva ser criada uma política de saúde voltada aos povos e comunidades tradicionais. No entanto, nem na nossa mais recente edição da Política Nacional de Atenção Básica, de 2011, encontramos referências ao uso ou recomendação das práticas populares ou tradicionais de saúde. Desde 2007 a Secretaria Estadual de Saúde RJ vem participando do Forúm Intersetorial Voz Aos Povos Quilombolas, Assentados e Acampados Rurais, Indígenas e Pescadores Artesanais, tendo sido inclusive um dos seus membros fundadores. Através de reuniões mensais ora na capital (Defensoria Pública do Estado) ora nas comunidades, este Fórum tem sido um instrumento de participação de algumas comunidades em situação de vulnerabilidade, no mapeamento e encaminhamento de demandas e necessidades. Questões de saúde que vão desde problemas e dúvidas com a Atenção Básica até especificidades como Doença Falciforme e Tuberculose vêm sendo trabalhadas neste Fórum sempre que demandadas. A partir da participação desta Secretaria no Programa “Territórios da Cidadania” lançado em 2008 pelo Governo Federal constituiu-se o GT do mesmo nome que articulou ações entre as diversas secretarias municipais de saúde das regiões prioritárias deste programa na ocasião no ERJ (Norte e Noroeste). Como produto deste GT cita-se 2 seminários em Campos dos Goytacazes que objetivaram a troca de experiências exitosas em saúde com as populações quilombolas e de assentados e acampados rurais na região Norte. No 2º semestre de 2011 este GT passou a se chamar GT das Populações do Campo e da Floresta em consonância com a Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta (PNSIPCF) e vem trabalhando com a missão de garantir o acesso à saúde integral a estes povos. Foi dentro do âmbito destes trabalhos que duas áreas técnicas da Atenção Básica da SES, a das Populações em Situação de Vulnerabilidade e a das Práticas Integrativas e Complementares se juntam num projeto que para além de contemplar o sentido das 2 áreas técnicas contribui para a missão maior do GT. Como objetivo geral temos o fortalecimento do acesso à Saúde pelas comunidades quilombolas de Estado do Rio de Janeiro e como objetivo específicos: 1)Articular com a Atenção Básica e outros setores de cada município -Secretarias de Educação, de Assistência Social e Direitos Humanos, de Agricultura e outras-, a fim de fortalecer a qualidade de vida das populações que vivem em quilombos; 2)Registrar o conhecimento tradicional em plantas medicinais e as práticas populares das comunidades escolhidas a fim de garantir a participação de benefícios deste conhecimento; 3)Definir material para a elaboração de uma cartilha/almanaque com os conhecimentos tradicionais em plantas medicinais e práticas populares para ser devolvido às comunidades quilombolas e utilizado em escolas, etc..; 4)Oferecer novos usos para as plantas medicinais conhecidas, que sejam de domínio público, às comunidades quilombolas; 5) Elaborar cartilha destinada aos profissionais de saúde da equipe de saúde da família, para facilitar e fortalecer o vínculo com as comunidades quilombolas; 6) Promover dois Seminários internos que envolva as comunidades relacionadas e os profissionais de saúde da região; O método atende as seguintes etapas: 1. Construção do instrumento diagnóstico;. 2. Realização de um mapeamento detalhado sobre as práticas de saúde, a cultura e os valores associados a estas comunidades (visitas, entrevistas, registros visuais);3.Sistematização e análise das informações recolhidas 4. Organização de seminários entre profissionais municipais e estaduais de AB para a reflexão e encaminhamento dos conhecimentos investigados e produzidos. 5.Promover um Encontro Estadual de Saúde Quilombola. A etapa atual é a de visitas com vistas a apresentação do projeto e contato entre os profissionais e comunidades. Podemos falar da recepção calorosa, dos primeiros relatos de práticas tradicionais de saúde e da evidência das enormes necessidades sociais destes povos. Acredita-se ter resultados mais palpáveis na época da apresentação nesta Mostra, assim como ter conclusões postivas sobre o desenvolvimento de estratégias que facilitem o acesso à saúde mais especificamente à AB, valorizando suas práticas de saúde e cultura.