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O Audiovisual na educação politécnica: desvelando as imagens
Resumo
A disciplina de audiovisual oferecida pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/FIOCRUZ) como uma das habilitações da educação artística tem por objetivo familiarizar os alunos de nível médio as diversas possibilidades de linguagem audiovisual. A concepção de politecnia surge no século XIX no contexto do capitalismo industrial, como crítica à divisão social do trabalho empreendida por Marx. A dinâmica da sociedade moderna e seus avanços no que tange ao desenvolvimento das forças produtivas implica um aumento dos conteúdos científicos, que transformam de forma cada vez mais veloz a natureza e as relações sociais. Segundo Marx, a alienação humana é reforçada pelas exigências de especialização extrema e de unilateralidade de um trabalho subsumido ao capital. Deste modo, os movimentos sociais e partidos políticos deveriam empregar um tipo de educação voltada para a formação do homem omnilateral, capaz de conhecer os fundamentos técnico-científicos da sociedade moderna, suas implicações históricas, políticas, sociais, bem como seus diferenciados processos de produção, estando disposto a realizar de forma integrada atividades teóricas e práticas de acordo com as necessidades sociais e com os desejos individuais. (Manacorda, 1996). Portanto, A EPSJV concebe a educação como um projeto de sociedade e, neste sentido, defende a concepção politécnica que dialoga com a conjuntura social, econômica e política atual. Sendo o trabalho um dos eixos centrais de seu Projeto Político Pedagógico (PPP), justamente por ser através dele que o homem modifica a natureza e assim também se transforma, a EPSJV acredita que o trabalhador se educa no conflito e na contradição e deve se munir do conhecimento produzido socialmente para que, com ele, possa travar a luta contra a divisão social do trabalho e contra a dominação do homem pelo homem. Em consonância com a concepção politécnica, o curso de audiovisual foi idealizado e coordenado pelo Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde, o NUTED, e tem como objetivo geral familiarizar os alunos com as possibilidades da linguagem audiovisual dentro de uma dinâmica que reúna teoria e prática, para propor a leitura crítica da sociedade de imagens. Além do estudo da linguagem cinematográfica como expressão artística, é objetivo refletir sobre o uso da imagem como instrumento político. Cientes de que já existe, em diversos cursos oferecidos pela escola, um farto uso de material audiovisual (fotografias, filmes, documentários, etc), esse curso busca complementar essa relação, dando ao aluno instrumentos para trabalhar de forma crítica essas imagens. Neste sentido, não se valoriza apenas o ensino das tecnologias de produção, reprodução e difusão das imagens, mas fundamentalmente pela compreensão do papel da proliferação das imagens no mundo real. Forma não se descola do conteúdo: como estou produzindo não se separa do que estou produzindo. O curso atravessa os 3 anos letivos do ensino médio. Em tempos de semiformação mitificada pela sociedade espetacular (Adorno, 2012) (Debord, 1997), o audiovisual cumpre um papel importante na formação dos alunos como elemento intelectual e artístico capaz de forjar leituras de mundo autênticas, unindo elaboração crítica sobre a realidade e sensibilidade. O currículo é montado a partir de um conjunto de metodologias que se diferenciam e se combinam ao longo dos três anos dentre elas estão: cineclubismo, história dos movimentos artísticos de vanguarda, estudo crítico da estrutura da narrativa cinematográfica, cartas audiovisuais e produção audiovisual. Para além do estudo sistemático da constituição da linguagem cinematográfica ao longo de seu desenvolvimento histórico, visa-se problematizar e refletir sobre o uso da imagem. Baseados nestes pressupostos, a metodologia pensada já para as aulas iniciais se vale de exercícios com o intuito de desnaturalizar o olhar para as imagens presentes no cotidiano. Nessas aulas são distribuídas para os alunos imagens retiradas de jornais, revistas, propagandas e internet. O aluno escolhe uma das muitas imagens e justifica sua escolha para a turma. “Por que essa imagem?”, “O que essa imagem quer dizer?”, “O que essa imagem mostra e o que ela esconde?”, “Qual a relação entre você e a imagem?”, “Como esta imagem te afeta?”, “Se você pudesse modificar essa imagem, o que faria?” são exemplos de provocações levantadas pelo professor. O objetivo dessas aulas é fazer com que os jovens alunos reconheçam que as imagens produzidas e disseminadas no cotidiano, sobretudo advindas da publicidade e propagandas, da televisão e cinema, não são fortuitas ou ocasionais. A indústria cultural na era da globalização explora a dimensão visual, suscitando uma sociedade caracterizada pelo domínio das formas eletrônicas de informação e comunicação, bem como pela produção e absorção excessiva de imagens de maneira não reflexiva. Elas, em verdade, reproduzem interesses e ideologias que foram historicamente construídos. Para além disso, a proposta busca ser um espaço para o exercício da criatividade, por vezes, copitada na sociedade do espetáculo, em que se está em cheque a velocidade, a repetição, o sempre idêntico. Interferir nas imagens escolhidas possibilita a abertura de horizontes para o exercer da subjetividade e da liberdade para imaginar outras imagens, permitindo aos jovens problematizar o existente e imaginar novas formas de sociabilidade humana, características presentes no projeto de uma educação politécnica."Usar o audiovisual como instrumento de documentação e de transformação da sua realidade e mesmo da sociedade como um todo na medida que constitui um contra-discurso capaz de 'curto-circuitar' a unilateralidade e a unanimidade de discursos tomados como 'naturais' e evidentes em si mesmo” (HEFFNER, 2009). Referências: ADORNO, Theodor. Teoria da Semicultura. Disponível em <http: //www.educacaoonline.pro.br/art_teoria%20da%20semicultura.asp?f_id_artigo=523>. Acesso em: janeiro, 2012. DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. RJ: Contraponto, 1997. MANACORDA, M. Marx e a pedagogia moderna. SP: Cortez, 1996. HEFFNER, Hernani. Retrato de um artista jovem. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO POPULAR EM AUDIOVISUAL – DESEDUCANDO O OLHAR. Texto. Rio de Janeiro, 2009.