Tamanho da fonte: 

Caracterização do problema Nas diferentes áreas profissionais da Saúde, a formação oferecida na Graduação está longe ainda de conferir a ênfase necessária ao estudo do Sistema Único de Saúde - SUS e da Reforma Psiquiátrica, no âmbito teórico, e, sobretudo, no prático. Com esta lacuna em sua formação, os trabalhadores dos serviços abertos em Saúde Mental encontram grandes dificuldades no exercício cotidiano do cuidado. As Residências em Saúde Mental representam hoje uma importante forma de enfrentamento da distância entre a formação acadêmica dos profissionais e os saberes teórico-práticos dos novos serviços de Saúde Mental. Contudo, muitas Residências recorrem ainda ao hospital psiquiátrico como cenário de prática, pois um número significativo de usuários de seus municípios ainda são encaminhados a eles; desta forma, perdem a oportunidade de formar profissionais em redes verdadeiramente abertas, com os desafios que lhes são próprios. Por outro lado, a formação dos trabalhadores de saúde mental não médicos acontece quase sempre sem articulação com a formação de psiquiatras, evidenciando a fragilidade ou inexistência das relações entre Residências Multiprofissionais e Residências em Psiquiatria. Torna-se necessário criar Residências Integradas em Saúde Mental nas quais estas relações se estabeleçam de forma consistente.A partir desta perspectiva efetivamente interdisciplinar, os residentes de todas as áreas profissionais da Saúde devem acompanhar toda a trajetória do usuário em diversos serviços e níveis de atenção, em uma rede de Saúde Mental de serviços abertos, aprendendo a cuidar em liberdade. Descrição da experiência A Escola de Saúde Pública de Minas Gerais - ESP MG e a Secretaria Municipal de Saúde de Betim - SMSA vêm construindo suas Residências nesses moldes. Em 2010, iniciou-se a Residência Multiprofissional em Saúde Mental, na qual todos os residentes participam de um núcleo formativo comum na ESP-MG, como subsídio para conceber, construir e sustentar a atenção em redes de serviços abertos. Em Betim, cuja rede acolhe inclusive casos graves e crises, os residentes atuam na atenção básica, no centro de convivência, nas residências terapêuticas e nos CAPS I, II e III (incluindo CAPS i e CAPS ad), sob supervisão de preceptores de sua área profissional. As atividades educacionais desenvolvidas na ESP-MG consistem em supervisões e reuniões clínico-institucionais, e seminários temáticos: Construção de Redes em Saúde Mental, Psicopatologia e Aspectos Históricos e Antropológicos do Sofrimento Mental. Em 2012, a parceria ESP-MG/SMS Betim iniciou sua primeira turma da Residência em Psiquiatria, pautada pelas mesmas diretrizes da Residência Multiprofissional, e estreitamente articulada a ela. Os residentes de Psiquiatria participam do núcleo formativo comum na ESP-MG, e atuam ao lado de seus colegas da Multiprofissional na rede de Saúde Mental de Betim. A Secretaria de Saúde do município pretende ainda desenvolver atividades teóricas in locu, coordenadas pelos preceptores da rede betinense, que integrarão também as Residências em Saúde Mental às demais Residências do município (Saúde da Família, Saúde da Mulher, e outras). As Residências em Saúde Mental possuem uma Coordenação Colegiada, com representantes da ESP-MG e da SMSA Betim. Efeitos alcançados Os residentes adquirem visão global e crítica da rede, conhecendo e enfrentando os seus problemas. Manejam casos e situações de grande complexidade, sustentando o cuidado em liberdade. Tutores, preceptores e demais professores também apuram o seu ensino, desenvolvendo as questões teóricas a partir da problematização das práticas. O projeto político-pedagógico da ESP-MG, que visa a integração pesquisa-ensino-serviço, é fortalecido pelo diálogo com o cotidiano da rede de atenção betinense. Avança a qualidade do atendimento nos serviços da rede de Saúde Mental local. A integração entre as Residências propicia uma real formação interdisciplinar. Consolida-se a prática do intercâmbio com outras Residências. Empreende-se, no âmbito do SUS, a articulação da dimensão da política à dimensão do cuidado. Promove-se a busca de uma parceria efetiva entre as instituições envolvidas, através da elaboração conjunta da programação teórico-prática, e do estabelecimento de uma Coordenação Colegiada. Através das Residências em Saúde Mental, pretende-se formar profissionais altamente qualificados para atuar nas redes locais de Saúde e/ou em instituições de formação. Eles serão aptos tanto para o atendimento quanto para o ensino, superando assim a dicotomia entre estas duas dimensões. Recomendações Apesar do significativo aumento do número de Centros de Atenção Psicossocial -CAPS no país, as redes de cuidados diversificadas o bastante para propiciar o cuidado em liberdade existem em poucos municípios. As Residências em Saúde Mental devem problematizar o recurso aos hospitais psiquiátricos como locais de tratamento e cenários de prática, favorecendo sua superação pela ampliação local dos serviços abertos. A integração entre a Residência Multiprofissional e a Residência de Psiquiatria revela-se indispensável para desfazer posições corporativistas e assegurar a interdisciplinaridade. As Escolas de Saúde Pública, vocacionadas para a articulação ensino-serviço, são parceiras fundamentais na implementação das Residências. Assim constituídas, as Residências em Saúde Mental favorecem a superaçao do descompasso mencionado mais acima entre a graduação universitária e os saberes e práticas dos serviços abertos em Saúde Mental. O exercício da parceria interinstitucional na condução e realização das Residências mostra-se um difícil desafio a ser enfrentado com firmeza e atenção. 1 Psiquiatra, Doutora em Filosofia, Coordenadora do Grupo de Produção Temática da ESP-MG, tutora e preceptora das Residências em Saúde Mental, representante da ESP-MG na Coordenação Colegiada das Residências. 2 Psicóloga, Mestre em Saúde Pública, participante do GPT-SM/ESP-MG, tutora da Residência Multiprofissional em Saúde Mental, e membro do Corpo Docente da Residência em Psiquiatria.