Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Trabalho e Saúde: um olhar de gênero sobre uma multinacional do ramo de energia
Josiene Karla Alves Silva

Resumo


O cenário mundial contemporâneo vem sendo marcado por inúmeras e complexas transformações político-econômicas e sócio-culturais, de modo especial a partir da década de 1980 e particularmente no Brasil a partir de 1990. Essas transformações têm, em parte, origem nas relações desenvolvidas no cerne da denominada modernidade e se agravado na atualidade, sendo caracterizadas basicamente pela mundialização econômica, desenvolvimento tecnológico com ênfase na microeletrônica e intensificação das tecnologias de informação culminando em uma reestruturação da produção e da organização do trabalho sem precedentes. De acordo com CESAR 1998 essas novas transformações levaram à formação de um novo tipo de trabalhador e à re-qualificação dos que já estão inseridos no mercado de trabalho, demandando o seu ajustamento às novas atribuições e comportamentos demandados pelo mercado. Considerando as características requisitadas para esse “novo” trabalhador, destacamos entre outras, em maior ou menor medida: A exigência de trabalhadores multifuncionais, polivalentes, dinâmicos, inovadores, capazes de lidar com habilidade e iniciativa diante de imprevistos relacionados ao contexto ocupacional. A aceleração do ritmo de trabalho necessário, ao passo que a força física empregada nas atividades laborais diminui consideravelmente. No entanto, o volume de informações produzidas é gigantesco o que demanda do trabalhador respostas rápidas em um contexto de trabalho no qual o espaço tempo é cada vez mais compactado. Solicitação por parte das organizações de maior envolvimento da subjetividade do trabalhador, o que se expressa no comprometimento com os resultados almejados, extrapolando por vezes o tempo do não trabalho em nome do alcance dos objetivos estratégicos.Diminuição do volume e fluxo de documentos físicos com aumento proporcional de arquivos virtuais. Tais alterações nas exigências do perfil profissional e nas expectativas de desempenho dos trabalhadores impactam os processos biopsíquicos e sociais dos indivíduos, podendo contribuir com o surgimento de novas formas de adoecimento e sofrimento. Essa realidade interfere na configuração dos modos de vida, organizados a partir do trabalho, formando um contexto no qual a produtividade domina o cotidiano dos indivíduos e ultrapassa a linha formal delimitada pelo contrato de trabalho. Ao observarmos essa discussão pela ótica do gênero associada à saúde dos trabalhadores e trabalhadoras, buscamos desenvolver uma abordagem que considera as relações de gênero e a divisão sexual do trabalho em um exercício de ampliação da questão saúde. Compartilhamos o entendimento de BRITO (2000: 196) ao assinalar que “A saúde é expressão de condições sociais, culturais e históricas das coletividades em que o trabalho desempenha papel crucial. O trabalho realizado em nossa sociedade é determinado por complexo entrelaçamento de relações de poder, sociais, econômicas e políticas. Nesse momento de globalização e reestruturação produtiva, aumenta a necessidade de dar um passo na apreensão da realidade vivida pelos (as) trabalhadores (as) não só no ambiente interno de trabalho, como também em seu cotidiano, nos locais de convívio e moradia, ampliando o leque de interrogações e incorporando enfoques que colaborem para a apreensão das desigualdades e heterogeneidades produzidas. Os estudos concernentes à divisão sexual do trabalho e às relações de gênero se inserem nesta perspectiva. Propõe-se que esses conceitos sejam assimilados nas análises que enfocam saúde e trabalho, em virtude de sua capacidade de trazer à tona problemas coletivos que permanecem ocultos quando as diferenças são negadas.” Ao pensarmos em saúde, trabalho e reestruturação produtiva atualmente, faz-se necessário utilizar um conceito ampliado de trabalho, que considere o trabalho doméstico e suas respectivas interações com os modos de vida e conseqüentemente com a organização e reprodução social. A saúde é produzida a partir das relações sociais, de classe e de sexo, de acordo com BRITO (apud NORIEGA, 1995) emerge nos últimos anos estudos específicos da relação saúde/trabalho a partir de um olhar sobre a mulher trabalhadora, evidenciando a impossibilidade de separar, analítica e concretamente, os espaços de trabalho e de consumo, o trabalho e o descanso, o trabalho remunerado e não remunerado, apontando novos temas de pesquisa (Noriega, 1995).Nesta perspectiva, a categoria trabalho será utilizada como “uma categoria social e, por isso, deve ser tratada como tal em suas determinações múltiplas e não só como um fator de risco ambiental” Laurell (1981: 13). Buscamos contribuir com a produção do conhecimento observando a relação entre saúde, trabalho e gênero, considerando as questões históricas demarcadas pela centralidade do trabalho na organização da vida social. Desta forma, recorremos a conceitos que nos auxiliam na compreensão das relações trabalho-saúde e nas formas e expressões no trabalhador do processo de produção social de questões biológicas. De acordo com Minayo-Gomez & Thedim-Costa (1997) o trabalho organiza o modo de vida da sociedade, sendo que as práticas profissionais e seus rebatimentos sobre a saúde ocupam lugar central neste contexto. Buscamos analisar, em uma perspectiva de gênero, como a dimensão trabalho se articula com a noção de condição de saúde e a resultante da interseção destas com as relações sociais. De acordo com BRITO (Ibid) a divisão sexual do trabalho impõe jornadas ilimitadas para as mulheres, uma vez que elas seguem respondendo ao trabalho dentro e fora de seus lares representando esforço excessivo o que contribui para a progressiva deterioração da saúde feminina. Nosso estudo de caso em uma grande empresa de energia corrobora o entendimento de BRITO, dado que por meio da análise dos dados coletivos de saúde da força de trabalho no período de 2003 a 2008, observamos diferenças marcadas por gênero, tais como doenças osteomusculares e adoecimento psíquico em maior proporção para as mulheres do que para os homens. O campo de pesquisa conta com 500 trabalhadores sendo 440 homens e 122 mulheres, que desenvolvem suas atividades laborais em uma jornada de trabalho de 40 horas semanais em escritórios da empresa, que por questões éticas e de sigilo no tratamento e uso das informações, não será identificada. A pesquisa nesse momento está sendo finalizada e os resultados completos poderão ser conhecidos por todos no 10º Congresso da Rede Unida.