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OFICINAS DE CORPO VIVENCIAL EM GRADUAÇÃO NA ÁREA DE SAÚDE
Resumo
A formação de estudantes da área de Saúde carece de instrumentalização teórica e prática que facilite a compreensão do ser humano dentro da perspectiva de integralidade do Sistema Único de Saúde. Há predominância de exercício da racionalidade, em detrimento do desenvolvimento de sensibilidades. Perpetuam-se as dissociações entre corpo e mente, emoção e razão, que irão se refletir nas práticas dos futuros profissionais. A graduação pode oferecer condições para que os alunos aprendam a partir da integração entre suas funções intelectuais e suas vivências corpóreas e emocionais. A abordagem da Psicologia Corporal, surgida a partir da obra de Wilhelm Reich contribui para esta possibilidade, com a compreensão da unidade psicocorporal que tem aplicações na clínica, na pesquisa e na promoção da saúde. Trabalhar com esta perspectiva implica no trabalho de consciência psicocorporal do profissional para facilitar sua abordagem no cuidado de outras pessoas. O presente trabalho apresenta uma análise preliminar da prática pedagógica com aulas teórico-vivenciais sobre a unidade psicocorporal humana, com base na obra de Wilhelm Reich e de autores afinados com a compreensão da unidade psicocorporal. Discute o trabalho vivencial de alunos de Terapia Ocupacional, Psicologia, Fisioterapia e Belas Artes da UFRJ desde 2008 e de Psicologia nas Faculdades Integradas Maria Thereza, entre 2009 e 2011. Baseia-se nos programas, nas aulas e nos depoimentos dos alunos sobre suas experiências em sala de aula. Em 2008, foi ministrada a disciplina optativa “Abordagem psicocorporal e saúde reprodutiva” no Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, com o objetivo de discutir, com base na Psicologia Corporal, a atenção à gestação, ao parto e à amamentação. Já entre 2009 e 2011, a autora ministrou disciplina obrigatória “Psicologia e Expressão Corporal” e optativa “Psicoterapia Reichiana”, no curso de Psicologia das Faculdades Integradas Maria Thereza. Nestas disciplinas, foram realizadas aulas teórico-vivenciais em sala de aula tradicional, com carteiras em disposição circular com espaço no meio para os trabalhos vivenciais grupais. Desde 2011, no curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da UFRJ têm sido conduzidas as disciplinas: “Introdução aos Estudos sobre Corporeidade” e “Corpo e Movimento”, ambas optativas, com alunos de Psicologia, Terapia Ocupacional, Fisioterapia e Belas Artes. As aulas ocorrem em sala ampla do curso de Dança da Escola de Educação Física e Desportos da UFRJ. Esta sala, ampla e sem carteiras, permite grande liberdade de movimentos. No momento de discussão teórica, os alunos trabalham sentados em círculo no chão. Ainda na UFRJ, têm sido realizados pequenos trabalhos vivenciais relacionados aos temas das disciplinas: “Saúde Mental” e “Saúde da Mulher” no curso de Terapia Ocupacional e “Psicologia Geral” nos cursos de Terapia Ocupacional e Fisioterapia. O objetivo principal de todas as disciplinas é que os alunos desenvolvam uma compreensão introdutória da psicologia corporal e de sua aplicação com relação ao tema estudado, além de trabalharem sua consciência psicocorporal. As práticas vivenciais têm sido realizadas em sintonia com o conteúdo teórico e são desenvolvidas em períodos de duração entre 15 e 30 minutos, em geral. O contrato para o trabalho vivencial é sempre discutido na primeira aula. São contratados: o incentivo ao uso de roupas leves, o sigilo sobre as vivências dos colegas e a participação de acordo com a motivação e disponibilidade de cada um. Esclarece-se a importância do comprometimento de todos com a qualidade do trabalho vivencial, estimulando-se que todos participem. No correr e no final das disciplinas, têm sido realizados questionários de avaliação, e registros de depoimentos dos alunos e de imagens das oficinas vivenciais realizadas. As aulas envolvem trabalhos com os alunos sentados, deitados, ou de pé. As vivências incluem a expressão verbal apenas daqueles que desejarem. Todas as etapas da vivência são explicadas didaticamente pela professora, vinculando-as ao tema estudado. As práticas têm sido experimentadas com prazer e interesse pela grande maioria dos alunos. Tem sido evidenciada a possibilidade de educação da sensibilidade dos alunos para suas sensações corpóreas, de maneira integrada com seus sentimentos e com o conteúdo teórico. Os alunos têm descrito os benefícios para seu autoconhecimento, o relaxamento das suas tensões psicocorporais e bem estar em sala de aula, com reflexo positivo na sua vida pessoal. Estas aulas também têm facilitado o relacionamento entre os alunos e entre estes e a professora. Nas diferentes disciplinas, há principalmente dois desafios: apresentar em apenas em um semestre, a compreensão psicocorporal e sua aplicação e realizar trabalho vivencial em sala de aula, já que esta é uma prática raramente presente no meio acadêmico. Por falta de prática ou disponibilidade emocional, nem todos os alunos se disponibilizam para o trabalho vivencial inicialmente, principalmente quando a disciplina era obrigatória. Mesmo assim, a resistência inicial gradativamente cedeu e eles passaram a integrar as vivências e a descrever os benefícios dos trabalhos psicocorporais. Já nas disciplinas optativas, tem havido adesão total dos alunos aos trabalhos vivenciais, com maior disponibilidade dos alunos. Alguns alunos da FAMATH introduziram breves trabalhos psicocorporais na sua prática como estagiários de psicologia no Serviço de Psicologia Aplicada da instituição. Ali, algumas monografias foram orientadas pela autora, sob a ótica psicocorporal e nos encontros para orientação de monografias, vivências psicocorporais foram realizadas no sentido da construção da confiança dos alunos no seu processo criativo. Nos trabalhos psicocorporais realizados nas disciplinas “Saúde Mental”, “Saúde da Mulher” e “Psicologia Geral” na UFRJ, os alunos têm se beneficiado do contato com seu corpo, relatado um estado de relaxamento e disponibilidade maior para a aula, além da integração com o conteúdo estudado. A análise destas práticas indica os benefícios destas aulas para a educação da sensibilidade dos alunos para suas sensações corpóreas, de maneira integrada com seus sentimentos e com o conteúdo teórico desenvolvido na disciplina. A experiência tem evidenciado a viabilidade de realização de práticas vivenciais durante a formação acadêmica e sua contribuição para a produção de sensibilidades e habilidades cuidadoras integrando mente e corpo. Está sendo implantado Laboratório de Pesquisa e Vivência sobre Corpo do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da UFRJ. Este grupo de trabalho tem por objetivo de aprofundar os estudos sobre a compreensão teórica da unidade psicocorporal, corporeidade e técnicas educacionais vivenciais que facilitem a formação de profissionais sensíveis à integralidade dos sujeitos dentro da perspectiva do SUS.