Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Relato de Experiência: Escola Popular de Saúde do Complexo do Alemão
Vitor Pordeus, Sandra Amado, Letícia Nunes

Resumo


CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA O Complexo do Alemão compreende 16 comunidades populares, com cerca de 4000 habitantes. No âmbito da assistência à saúde é notável a precariedade: possui uma Unidade de Pronto Atendimento e três Clínicas da Família. Em relação à educação e ao lazer, são poucas as opções e os recursos: são três escolas do município, uma vila olímpica e um mini-cinema. É notável a má questão sanitária referente à coleta de lixo. Há escassez de ambientes que estimulem o exercício criativo e consequentemente, a saúde. DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA Tendo em vista a inércia cultural na qual está imersa grande parte dos moradores de favelas, o Núcleo de Cultura, Ciência e Saúde, da Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro, promove saúde, cultura, arte e ciência por meio da Educação Popular em Saúde. Nessa localidade há a Escola Popular de Saúde do Complexo do Alemão, cuja sede é na Vila Olímpica Carlos Castilho, no Morro do Alemão. A Agente Cultural de Saúde, ex-Auxiliar de Controle de Endemias, catalisa as ações e oficinas que são propostas durante Rodas de Conversas. Essa conformação é utilizada por valorizar todos os saberes, sendo interativa, inclusiva, propositiva e afirmativa. Tal Agente dialoga com lideranças comunitárias e moradores que, a partir do consenso, refletem e agem sobre os problemas da comunidade. EFEITOS ALCANÇADOS Inicialmente, realizou-se a construção dos conceitos da pedagogia freireana e da emoção de lidar silveriana com a atual Agente Cultural de Saúde. Essa inseriu-se na realidade e concluiu a relevância da sua mudança de postura, exemplificada pelo relato: “o trabalho mecânico de entrar e sair das casas procurando depósitos de água deu lugar à procura de vidas latentes, ora felizes ora agoniadas, vidas com dificuldades, mas prazerosas”. A partir disso, houve a aproximação com a comunidade. Essa relação social é baseada na escuta e na fala de todos, sem a obrigação do discurso nem da participação involuntária. O grupo de mulheres engloba cerca de 15 mulheres de meia idade que iniciaram a problematização tendo como tema gerador o excesso de lixo local. As integrantes do grupo Mulheres Guerreiras vieram de regiões como Nordeste e outros estados do Sudeste. Sobreviver nesse novo ambiente sempre foi uma luta, cujo objetivo é construir uma família e oferecer uma vida melhor a ela. Mas ao deparar com tantas dificuldades apresentadas como a falta de Trabalho, Educação e Saúde, essas mulheres superaram a vergonha e o preconceito, submetendo-se a, por exemplo, procurar no lixo o sustento da família, enfrentar os vícios e a violência com auxilio de grupos anônimos, trabalhar com artesanato, fazer palestras nas escolas sobre a vida como moradoras de ruas, voltar à escola para alfabetizarem-se e ajudar jovens e crianças da comunidade sem nenhum lucro financeiro, pois elas são ricas de afeto e compreensão. A fim de melhorar a educação ambiental, promoveram mutirões de limpeza e angariaram parcerias como a Central Única das Favelas (CUFA), o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) da Secretaria Municipal de Assistência Social e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). Visando à sustentabilidade, realizou-se oficinas de reciclagem utilizando resíduos sólidos como garrafas pet, caixas de leite e jornais para produção de bolsas, carteiras, acessórios, brinquedos, instrumentos musicais, máscaras e fantasias de carnaval. O projeto obteve tanto sucesso que tem sido utilizado como meio de geração de renda. Devido à grande qualidade e efetividade, essa oficina foi contratada pelo Serviço Social do Comércio do Rio de Janeiro (Sescrio), ambiente “referência nas áreas de Cultura, Educação Social, Esporte e Lazer, Saúde e Turismo”, trecho retirado do site http: //www.sescrj.com.br/sesc-rio. Durante dois dias, tal oficina contou com a participação de 40 pessoas de diversas idades. Visando à educação patrimonial e a busca pela ancestralidade foram visitados locais como o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, o Centro de Artes Calouste Gulbenkian, o Museu de Imagens do Inconsciente no Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silviera, a FioCruz e o maciço Serra da Misericórdia. Importantes parcerias são a CUFA, onde vários jovens e crianças fazem esporte e oficinas de arte; e o projeto governamental Verdejar que envolve teatro, hortas medicinais e preservação da Serra da Misericórdia. Foi inaugurada a Biblioteca Cantinho Paulo Freire e desenvolvido o projeto “De Bem com a Vida”, que acontece pela manhã em Igreja da comunidade e estimula a atividade física. O Núcleo trabalha sob o paradigma do conceito ampliado de saúde e atua no sentido de promovê-la. Sendo assim, em 14/02/2009, ocorreu a Celebração da Saúde e da Cidadania no território, espetáculo público que valoriza e legitima o protagonismo e o saber populares, que convida moradores e artistas comunitários a se apresentarem no espaço público. A proposta para 2012 é articular os projetos eco-político-pedagógicos com Escolas Municipais locais e consolidar a oficina de teatro. Para a construção do teatro, será utilizada a metodologia do Ator sem Papel do Teatro de Rua (Amir Haddad). A fim de catalisar os afetos e agregar participação desenvolve-se o teatro épico-dialético-carnavalizado. Sendo comunitário e emancipatório, o intuito é democratizar e difundir tanto a arte quanto o conhecimento, realizar apresentações teatrais em espaços não convencionais, tais como: escolas, vilas olímpicas e praças. A participação na oficina é voltada para os moradores da comunidade, os quais terão acesso facilitado devido à proximidade e à ausência de custos. A ferramenta teatral será utilizada com o propósito educativo, uma vez que estimula o pensar criativo, a interdisciplinaridade, o trabalho coletivo, a formação dos indivíduos numa perspectiva de desenvolvimento social, afetivo, estético, ético e cognitivo; além de estimular o debate de questões que envolvem o cotidiano, o ambiente torna-se propício à experimentação e à reflexão. Sempre valorizando o coletivo, a cooperação, a equidade, a universalidade e a integralidade. Os resultados experimentais estão legitimados e documentados no endereço eletrônico www.nccsrio.blogspot.com. RECOMENDAÇÕES O projeto multidisciplinar utiliza métodos pedagógicos, libertários, culturais e democráticos para promover saúde por meio da óptica holística. Discute-se amplamente a sustentabilidade. O teatro é fundamental por ser um canal de expressão e instrumento de reflexão e interação social, o qual proporciona aos indivíduos o acesso à arte, à fluência de idéias e experiências que contribuem para a promoção da saúde e da cidadania. Citando Nise da Silveira e Paulo Freire, tem-se, respectivamente: “O que cura é a falta de preconceito”, “Mudar é difícil, mas é possível”.