Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Residentes de saúde coletiva na Secretaria de Saúde do Recife: diálogos e práticas com o apoio institucional
Sayonara Arruda Vieira Lima, Juliana Santos Siebra Brito, Mônica Sousa Gomes da Silva, Fernanda Guerra

Resumo


As residências multiprofissionais de saúde coletiva da Faculdade de Ciências Médicas (Universidade de Pernambuco) e do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (Fiocruz) orientam, em seu projeto político-pedagógico, a experiência nos setores de gestão e planejamento, nos estágios para formação profissional. Seguindo esta orientação, as autoras, enquanto residentes, vivenciaram um período de preceptoria com os apoiadores institucionais da Secretaria de Saúde do Recife, os quais desenvolviam suas atividades nos distritos sanitários (DS) II e III, que correspondem, juntos, a 47 bairros do Recife. O município iniciou, em 2009, o modelo de atenção “Recife em Defesa da Vida”, que, entre outras, tem como ferramenta de gestão o Apoio Institucional (AI), cujo trabalho baseia-se na análise institucional, um ramo da psicologia aplicada a coletivos. Os apoiadores trabalham em dupla em cada um dos seis distritos sanitários do Recife, atuando como elo entre a gestão do nível central, distrital e equipes de saúde da família (ESF), colaborando através de recursos pedagógicos, analíticos e políticos. Um dos trabalhos precípuos dos apoiadores foi dar suporte técnico e político às ESF, nas discussões de implantação dos dispositivos do novo modelo, como acolhimento, projeto terapêutico singular, apoio matricial e clínica ampliada. A proposta de implantação do acolhimento desenvolveu-se através de um grupo de trabalho, que se reuniu periodicamente durante todo o primeiro semestre de 2009, o Grupo Acolher Recife, onde discutiu-se as práticas acolhedoras já em experimentação na rede de atenção à saúde do Recife, bem como o que havia na literatura sobre o tema, incluindo a experiência de outros municípios. Este grupo foi composto por profissionais da atenção primária, apoiadores e gestores, baseando-se na linha da co-gestão, mesmo assim, nas primeiras reuniões do AI com ESF, observaram-se resistências ao diálogo e uma postura defensiva de muitos profissionais com relação à mudança na organização do processo de trabalho. Além das reuniões com as equipes, realizou-se o Curso Introdutório, para todos os distritos sanitários, onde foram discutidos os dispositivos citados, tendo as residentes atuado na facilitação dos grupos. Nestes espaços de elaboração da proposta do acolhimento, algumas equipes de saúde da família que já tinham, por iniciativa própria, iniciado esta experiência, podiam compartilhar um pouco de suas vivências com os demais profissionais. A etapa seguinte do AI foi reunir-se com cada unidade de saúde da família para, em co-gestão, construir o modelo de acolhimento para aquela unidade, sendo constituído um espaço coletivo para avaliação e apoio periódicos às práticas em cada DS, que são as reuniões de microrregiões de saúde. Cada distrito sanitário é subdividido em microrregiões de saúde e estas são administradas pelo gerente de território (GT). O trabalho do GT também pode ser qualificado como de um apoiador institucional, entretanto a carga de cobranças e demandas sobre este personagem dificulta tanto a co-gestão quanto a disponibilidade de tempo para uma dedicação maior ao processo de implantação do novo modelo. Por vezes, o GT sofria resistência por parte dos profissionais da atenção básica por ter sua atuação relacionada a antigos modelos de gestão autoritários e tayloristas, em alguns momentos, este gerente era cobrado por demandas administrativas da unidade que não tinham sido solucionadas. Desta forma, o AI tem um papel importante no processo de co-gestão e diálogo com as ESF, por não estar com a imagem desgastada pelo o dia-a-dia de dificuldades da administração do território. Pode-se observar, nesta fase, que as ESF, muitas vezes, apresentavam-se reticentes quanto ao novo modelo de organização do trabalho. Naquelas unidades que já tinham iniciado o processo, as equipes estavam divididas quanto à decisão, enquanto uma acolhia, outra se abstinha do compromisso, e os profissionais que realizavam acolhimento sentiam-se sobrecarregados com a demanda de outras áreas. Constantemente, muitos profissionais da ESF colocavam problemas estruturais da unidade como um fator limitante para o desenvolvimento da proposta. Houve também dificuldades em incluir as equipes de saúde bucal no atendimento aos usuários que buscavam o acolhimento (ESB), pois muitos dentistas se sentiam inseguros para a escuta de demandas que não eram específicas de saúde bucal e em dar uma resposta positiva para os usuários. Para promover uma maior segurança dos profissionais da unidade de saúde da família no encaminhamento dos pacientes, foram elaborados protocolos de atendimento com fluxos de cuidado para as queixas mais freqüentes das pessoas que buscavam o posto de saúde. Havia uma expectativa nas reuniões dos gestores municipais quanto à construção de uma proposta de acolhimento para as unidades básicas de saúde, já que o modelo desenvolvido adequava-se ao funcionamento da estratégia de saúde da família. Um dos resultados positivos do AI foi a aproximação da gestão municipal com os DS, havendo vários relatos sobre uma maior integração no processo decisório. Outro efeito alcançado foi o contato com os desejos dos profissionais, descobrindo-se as várias motivações destes em relação ao trabalho. Para aprofundar o conhecimento das residentes sobre a linha teórica utilizada, montou-se um grupo de estudo abordando temas relacionados com a metodologia orientadora do AI: psicanálise, análise institucional, micropolítica do trabalho e filosofia. A percepção das residentes foi positiva, em relação à atuação baseado na co-gestão com as ESF, na perspectiva de estabelecer o processo de trabalho a partir de um contrato, baseado na psicanálise, e da escuta.