Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


Tamanho da fonte: 
VIDA SIM! PROGRAMA DE PREVENÇÃO AO SUICÍDIO EM MUNICÍPIO DO SUL DO BRASIL
Lilian Zielke Hesler, Stela Nazareth Meneghel, Roger Flores Ceccon, Aline Gewehr Trindade, Marta Conte

Resumo


O suicídio é compreendido como um fato social (Durkheim, 1982) e caracteriza-se como um importante problema de saúde pública (Haqqi, 2008). É definido como uma violência auto-infligida e um ato decidido, iniciado e levado até o fim por uma pessoa com total conhecimento ou expectativa de um resultado fatal (OMS, 2002). No Brasil, o Rio Grande do Sul apresenta os maiores coeficientes de mortalidade por suicídio, com 11 mortes para cada 100 mil habitantes, o que justifica a inclusão deste agravo como prioritário na elaboração de políticas públicas (Meneghel et al., 2004).Inúmeras ações de prevenção foram efetivadas em diversos países do mundo na última década, muitas das quais por meio de rastreamento de situações de vulnerabilidade e ações educativas (Bean, 2011) as quais diminuiram significativamente as mortes por suicídio.No Brasil ainda existem poucas intervenções para enfrentar este problema. Essa constatação nos levou a estudar e apresentar uma experiência exitosa no enfrentamento do suicídio, que constituiu uma iniciativa local frente aos elevados índices de violência auto-infligida. A experiência é a do Programa de Promoção à Vida e Prevenção ao Suicídio na Candelária no Rio Grande do Sul, um município brasileiro que apresenta altos coeficientes de mortalidade por suicídio.O Programa conhecido como “Vida Sim” iniciou em 2009, a partir de uma proposta formulada pela Secretaria Municipal de Saúde e Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) com a colaboração de outras instituições locais. A equipe de trabalho que viria a elaborar o Programa deparou-se com os elevados coeficientes de mortalidade por suicídio no município e a situação de relativa banalização do fato. Frente a este cenário, foi organizado o PPS de Candelária, um município com 30.000 habitantes, centralizado no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e priorizando o atendimento para todas as tentativas de suicídio. O CAPS de Candelária opera com uma equipe composta por dois psiquiatras, dois psicólogos, um assistente social, dois monitores, uma enfermeira, um técnico de enfermagem, uma recepcionista, um auxiliar de serviços gerais e atende das 8 às 17 horas.O programa se propôs a romper com o tabu que cerca a situação da morte para conversar sobre o fato, em todas as instâncias, dentro dos serviços e com a população.A atenção foi estruturada em uma linha de cuidado, pensada como a disponibilização de fluxos assistenciais seguros e garantidos ao usuário visando atender às necessidades de saúde e promover atenção integral, estabelecendo vínculo e responsabilização (Franco e Franco, 2011). Para isso, foi preciso que os responsáveis pelos serviços de saúde pactuassem os fluxos e reorganizassem o processo de trabalho, com a finalidade de diminuir as barreiras de acesso dos usuários, envolvendo o trabalho das equipes de Estratégia de Saúde da Família, do CAPS, do Hospital, técnicos da EMATER e socorristas (SAMU, bombeiros e policiais civis).Nesse processo de organização do trabalho, as diversas instituições que compõem a rede, ao atender uma tentativa de suicídio, imediatamente encaminham esse usuário ao CAPS, que rompe com a posição da “fila de espera” para imediatamente acolher e colocar esta pessoa em atendimento. Esta medida pauta-se no fato de que uma fração relevante de suicídios ocorre em pessoas que fizeram tentativas prévias (Mrazek 1994). A atenção aos usuários compreende ações individuais, familiares e grupais. Para os usuários que vivem em região rural são realizadas visitas domiciliares e a ESF acompanha os pacientes e famílias de modo mais individualizado, atentos a possíveis manifestações que possam significar agudização do risco.Todos os profissionais envolvidos com o Programa de todas as instituições parceiras, não apenas aqueles dos serviços de saúde, têm sido capacitados em uma perspectiva de educação permanente. A capacitação incluiu o planejamento compartilhado dos fluxos, o estabelecimento de um sistema de referência e contra-referência, a proposta de “portas abertas” para o atendimento no CAPS, o prontuário diferenciado para as tentativas de suicídio, a supervisão contínua, o fortalecimento da rede e das ações comunitárias e intersetoriais. A equipe do programa realiza avaliação contínua utilizando elementos produzidos nas discussões de caso, nas reuniões de trabalho e nas próprias conversas informais entre os profissionais. Dentre os indicadores avaliados, consideram como resultados importantes, o aumento nos encaminhamentos de pessoas com história de tentativa de suicídio captadas nos diferentes níveis de atenção à saúde, a satisfação dos usuários, à resolubilidade da atenção, o monitoramento da retirada de medicamentos na Farmácia Municipal e a adesão aos atendimentos no CAPSRepresenta um programa inédito para a prevenção do suicídio, tanto em termos de originalidade e importância da proposta quanto em termos do impacto na mortalidade pelo agravo. Consideramos relevante descrever a experiência do Programa de Prevenção ao Suicídio de Candelária - Vida Sim! - para estimular a organização de programas similares em lociais de risco mostrando que pode-se obter impacto sobre o suicídio com a organização de programas na atenção básica e nos Centros de Atenção Psicossocial, desde que haja vontade política, compromisso e vínculo com os usuários e população.Referências: BEAN G, BABER K. CONNECT: An Effective Community-Based Youth Suicide Prevention Program. Suicide and Life-Threatening Behavior 2011; 41(1): 87-97.DURKHEIM E. O Suicídio. 3º ed. Lisboa, Portugal: Editorial Presença, 1982.FRANCO CM, FRANCO TB. Linhas do Cuidado Integral: Uma proposta de organização da rede de saúde. Disponível no site http: //www.saude.rs.gov.br/dados/1306960390341linha-cuidado-integral-conceito-como-fazer.pdf. Acesso: 16.11.2011.GOMES R, MINAYO MCS, ASSIS, SG, NJAINE K, SHENKER M. Êxitos na prevenção da violência. Brasília/São Paulo: HUCITEC, 2010.HAQQI S. Suicide and Domestic Violence: Could There Be a Correlation? Medscape J Med 2008; 10(12): 287.MENEGHEL SN, VICTORA CG, FARIA NM, PINHEIRO L. Características epidemiológicas do suicídio no Rio Grande do Sul. Rev Saúde Pública 2004; 38: 804-10.MRAZEK PJ, HAGGERTY RJ. Reducing risks for mental disorders: Frontiers for preventive intervention research. Washington DC: National Academy Press; 1994.ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Relatório Mundial sobre Violência e Saúde: Sumário. Geneve, 2002.