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A Atuação de Preceptores de Saúde da Família junto a Acadêmicos de Enfermagem: Desafios do Cotidiano
Resumo
O termo preceptoria tem sido utilizado com distintos significados, mas de um modo geral, refere-se ao exercício sistemático de acompanhamento e orientação de graduandos ou pós-graduandos. É consenso que esta forma dinâmica e aproximada de ensino visa a atender as mudanças propostas pela LDBEN/96 e DCN do curso de graduação em Enfermagem/2001, além de vir ao encontro das nossas necessidades atuais de um profissional menos teórico (não menos embasado cientificamente) e mais próximo da realidad. Este estudo teve por objetivos descrever e analisar o cotidiano de trabalho dos preceptores de saúde da família na atuação junto a acadêmicos de enfermagem do 8º período do Curso de Graduação. A preceptoria para graduandos de enfermagem é bastante recente no Brasil. Na prática, ela começou a ser mais discutida a partir de 1996, com o parecer 314/94 do Conselho Federal de Educação que, ao ser aprovado pelo MEC, constitui as portarias 1.721/94 e 001/96 que regulamentaram o currículo mínimo, que preconiza o estágio acompanhado pela Escola e pelos Enfermeiros dos Serviços de Saúde. Desde então, foi normatizado que seria necessário o acompanhamento dos alunos da graduação por profissionais do serviço. Nesta perspectiva, temos a evidência de um importante ator neste processo, que é o preceptor de enfermagem. Este, comumente, é um profissional que faz a ponte entre a academia, graduandos e serviço. No entanto, parece não existir ainda um manual específico que venha a oferecer subsídios claros para a atuação do preceptor de graduandos em campo de prática e tal fato, nos impulsiona a querermos realizar um estudo desta natureza. Pode-se destacar que a Estratégia de Saúde da Família como campo de estágio para estudantes de enfermagem, dentre outras contribuições: propicia o seu contato estreito com a comunidade; concretiza termos como co-responsabilidade, através do Diagnóstico da comunidade e do Planejamento estratégico; possibilita o desenvolvimento Educação em Saúde através de método problematizador; favorece a assistência integral e o desenvolvimento de ações com abordagem individual e coletiva; põe o estudante em contato com a interdisciplinaridade (NASF); contribui para a interpretação de dados epidemiológicos e estímulo ao planejamento de ações a serem realizadas a pequeno, médio e longo prazos; favorece o trabalho em equipe e as atividades de Educação Permanente em Saúde; permite a implementação da Política Humaniza SUS através de postura acolhedora, resolutividade e com classificação de risco; estimula a vivência do controle social; desenvolve a aptidão para as práticas intersetoriais e coloca o estudante em contato com as ações gerenciais e administrativas. A maioria dos preceptores se vê como responsável em passar procedimentos, técnicas e rotinas para os estudantes, sem necessariamente refletir, a contento, sobre a necessidade de adquirir ou aprimorar conhecimentos e competências que o ajudem a fazê-lo de forma efetiva. A despeito da importância e da singularidade da atuação dos preceptores de Saúde da Família, existem fatores que podem interferir no processo de preceptoria, dentre os quais ressaltamos: o perfil necessário para o desempenho desta função; a organização do tempo; o número de alunos a serem acompanhados; a necessidade de orientação clara sobre suas atribuições; o apoio por parte dos gestores; o estímulo profissional; a necessidade de discussões sobre a temática com trocas de experiências, entrosamento academia-preceptor-aluno e a falta de material de apoio. Acompanhando o cotidiano das ações desenvolvidas pelos preceptores de três unidades de saúde da família da CAP 5.1 do Município do RJ junto aos acadêmicos do 8º período do Curso de Graduação em Enfermagem da EEAN/UFRJ, observou-se que algumas das estratégias didático-pedagógicas utilizadas na preceptoria para facilitar o processo de ensino-aprendizagem dos graduandos de enfermagem incluíam: 1. Esboço de planejamento, com demais preceptores da unidade, fomentando a integração do grupo, levando em consideração as necessidades da comunidade e a diversidade de experiências importantes ao aprendizado do graduando; 2. Acolhimento dos graduandos; 3. Realização de uma roda com graduandos e preceptores a fim de refinar as apresentações; 4. Realização de um diagnóstico inicial do aluno; 5. Construção do planejamento das ações levando em consideração o esboço realizado anteriormente; 6. Construção de um contrato de convivência; 7. Diálogo entre a dupla de graduandos e seu preceptor de referência; 8. Estabelecimento de uma comunicação efetiva; 9. Reconhecimento por parte do aluno sobre o local de trabalho, tentando perceber suas rotinas e dinâmicas cotidianas; 10. Discussão sobre o percebido, o real e o ideal sobre o funcionamento da unidade; 11. Orientações sobre as expectativas da preceptoria relativas à postura e abordagem do aluno no processo de trabalho; 12. Planejamento e execução de Atividade de Educação permanente; 13. Condução de grupo a partir de método problematizador; 14. Identificação, a partir de dados epidemiológicos, de temas para realização de sala de espera; 15. Planejamento para realização de trabalhos educativos intersetoriais; 16. Encontro semanal com todo o grupo para discussão de casos advindos da prática, identificados pelos graduandos como relevantes; 17. Realização de teorização participativa antes da realização das consultas nas primeiras semanas, depois a medida que as demandas surgirem; 18. Realização de um diário de campo para o monitoramento próprio das atividades realizadas; 19. Encontro semanal com o tutor (professor supervisor do estágio) para discussão da evolução do processo de ensino aprendizagem, que é de fundamental importância para o refinamento do processo de ensino-aprendizagem. Finalmente, apresenta-se a questão da avaliação, que acontece cotidianamente como parte do processo de ensino-aprendizagem, sendo vista como ferramenta e não como produto. Ela é realizada com base em um instrumento que apresenta os seguintes critérios: comprometimento com o serviço; interesse pela aquisição de conhecimento próprio, da equipe e da comunidade; competência para realização de planejamento das atividades; apresentação pessoal, assiduidade, pontualidade; relação com a equipe, com o preceptor e com a comunidade. Em geral, a avaliação é feita antes do início das atividades, através do diagnóstico inicial do aluno; durante o desenvolvimento das atividades com enfoque não só no desempenho, mas na atitude reflexiva frente aos desafios; semanalmente através de auto-avaliação e orientação do preceptor sobre os avanços ainda necessários e após cada atividade realizada pelo aluno. “A medida que os estágios curriculares em serviço tornam-se, cada vez mais, um processo imprescindível para a formação profissional, a importância de um melhor entendimento do exercício da preceptoria e da figura do preceptor torna-se mais fundamental. Neste sentido, (re)conhecer o papel do preceptor como mediador de um processo de ensino-aprendizagem, significa retirá-lo do silêncio que o cerca para colocá-lo no espaço das inter-relações entre estudantes, professores, clientes/usuários, gestores e demais membros da equipe de saúde.” (Wuilleame, 2000) Acreditamos que o compartilhamento de experiências no acompanhamento dos alunos e de estratégias pedagógicas, bem como de dados pesquisados, que identifiquem as competências necessárias à prática da preceptoria de forma efetiva, possam levar o profissional que exerce preceptoria a desenvolver ou aprimorar suas competências. Para tanto, se faz necessário um esforço conjunto dos atores envolvidos neste processo (aluno, preceptor, academia e gestores), no sentido de construírem espaços e/ou instrumentos de discussão desta prática. No que tange a estes desafios, é preciso que estes atores busquem alcançar estratégias comuns para o alcance de uma melhor qualidade na formação dos enfermeiros que estarão assumindo as equipes de Saúde da Família para a consolidação da Atenção Primária no SUS.