Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Os determinantes sociais e câncer de mama: um panorama da saúde da mulher
Ana Claudia Correia Nogueira

Resumo


Introdução: O fio condutor desta reflexão parte da análise crítica do sistema de saúde, tendo como pano de fundo a questão do câncer de mama entre mulheres. É importante destacar que a intenção aqui não é centralizar a discussão na questão da doença em si, mas sim nos determinantes sociais que estão imbricados no processo saúde/doença, principalmente no que se refere ao alto índice de mortalidade entre as mulheres brasileiras. O Instituto Nacional de Câncer aponta que o câncer de mama é um dos tipos de câncer mais frequentes incidência e em mortalidade no mundo e o Brasil apresenta um dos maiores índices de mortalidade pelo diagnóstico tardio. Segundo a Estimativa INCA, em 2012, esperam-se, para o Brasil, 52.680 casos novos casos, com um risco estimado de 52 casos a cada 100 mil mulheres. Sem considerar os tumores da pele não melanoma, esse tipo de câncer também é o mais frequente nas mulheres das regiões Sudeste (69/100 mil), Sul (65/100 mil), Centro-Oeste (48/100 mil) e Nordeste (32/100 mil). Na região Norte (19/100 mil) é o segundo tumor mais incidente (INCA, 2011).A neoplasia mamária é a maior causa de óbitos na população feminina brasileira, principalmente na faixa etária de 40 a 69 anos e sua incidência varia em função de fatores como predisposição genética, obesidade, idade, sedentarismo, entre outras. Mas seu índice de mortalidade está atrelado muito a uma questão mais social, principalmente de acesso completo aos serviços de saúde. De acordo com dados mais recentes do Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM, 10.950 mulheres morreram em decorrência do câncer de mama.Objetivo: O estudo buscou compreender, através de pesquisa qualitativa - fundamentada em dados quantitativos, os aspectos que impossibilitaram as mulheres matriculadas no INCA, de detectarem precocemente o câncer de mama em estágios iniciais. Metodologia: Através das técnicas da pesquisa qualitativa – análise de discurso, o estudo problematizou a experiência que cada usuária entrevistada vivencia no cotidiano da macroestrutura do sistema de saúde. A exploração do campo contemplou as seguintes atividades: escolha do espaço para a pesquisa, escolha do grupo, estabelecimento dos critérios de amostragem e a escolha do espaço da pesquisa. O critério de inclusão nesta pesquisa se deu a partir da escolha das mulheres que apresentaram um diagnóstico de câncer avançado (estádio III ou IV) e que foram encaminhadas nos últimos seis meses para o Serviço de Oncologia do HCIII, o que possibilitou o levantamento do perfil dessas mulheres. Os dados do registro hospitalar do HCIII também subsidiaram a pesquisa.Resultados: Em 2009, foram matriculadas no INCA 502 mulheres no estágio inicial da doença, representando 15,4% das mulheres matriculadas durante o ano de 2006 e 2007. Em estadiamento II, foram 1114, ou seja, 31,4%. No estágio III, tivemos 1039 matrículas, 31,8% e em estadiamento IV, 367, sendo 11,2% do total de matrículas durante esses dois anos. Isso significa que a maioria das mulheres quando matriculadas no INCA, neste período, já apresentava a doença em evolução e não em fases iniciais conforme preconizam a Política Nacional de Atenção Oncológica e de Saúde da Mulher. Considerações: A busca pelos serviços de alta complexidade parece ser um grande dilema a ser enfrentado quando as mulheres descobrem que têm algum problema de saúde. Diante do relato das usuárias, podemos perceber que esse dilema é um grande desafio a ser enfrentado dentro da rede de saúde. Nesta discussão, encontramos a busca pelo acesso completo aos serviços de saúde. Se por um lado essas mulheres buscam na rede a detecção precoce, por outro elas esbarram nas deficiências do sistema em prover a efetivação desse direito.Outrossim, não podemos perder de vista que a representação da saúde se diferencia de acordo com a questão sociocultural e econômica da população, esse também é um fator presente nas entrevistas. Destarte que o universo do processo de adoecimento representa um paradigma a ser desmistificado. O acesso às informações de saúde para a classe trabalhadora parece estar mais distante de suas realidades por conta das condições de vida e trabalho neste contexto de exploração capitalista.Não obstante, a detecção da doença em estadiamento avançado reflete a falta de interlocução da política de saúde da mulher e traduz as refrações da questão social presentes na sociedade contemporânea. A pesquisa mostra que as dificuldades enfrentadas pelas mulheres em busca de um diagnóstico precoce esbarra com efetivação da integralidade dos serviços de saúde e aponta para a problemática do “acesso incompleto” (VIDAL, 2008) ao sistema de saúde. Esse aspecto estava frequentemente presente nos relatos e nos exames anexados aos prontuários, o que desmistificava, de certa forma, a noção que a dificuldade fosse somente a falta de informações sobre o câncer de mama e o desconhecimento dos procedimentos de detecção precoce. No caso do câncer de mama, a dimensão da intervenção em saúde a partir de uma efetiva atenção primária possibilitaria a detecção mais precoce. Entretanto, a patologia necessita de tecnologia para esta detecção; assim há necessidade de se articular as ações com os serviços de média complexidade, o que contribuiria em muito com diminuição do índice de mortalidade entre as mulheres por esta doença.Enfim, decifrar os aspectos socioculturais e macroeconômicos presentes no cotidiano das mulheres é tarefa fundamental para compreender o alto índice de mortalidade por câncer de mama no país, principalmente os impactos advindos desse processo de adoecimento na vida das mulheres trabalhadoras. Enfim, a saúde é um dos espelhos da abissal desigualdade social brasileira e recuperar/manter o sentido mais amplo da saúde e sua dimensão coletiva constitui-se não somente como desafio para a política de saúde, mas um compromisso ético-político de cada gestor e profissionais da saúde na formulação de estratégias políticas que busquem reforçar os princípios da Reforma Sanitária. Bibliografia: AROUCA, A. Sérgio. O dilema preventivista: contribuição para compreensão e crítica da medicina preventivista no Brasil. São Paulo: Editora UNESP, Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2003, p. 209-264.BERLINGUER, Giovanni. A doença. Trad. Virginia Gawryszewski. São Paulo: Centro Brasileiro de Estudos da Saúde, 1988.BORGES, João Bosco et al. Perfil das mulheres no município de Jundiaí quanto ao hábito do auto-exame das mamas. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 54, n. 2, p. 113-122, Abril/Junho, Rio de Janeiro, 2008. BORGES, Cássio. Epidemiologia do câncer no Brasil. In: Mastologia - informações sobre as doenças da mama. 17 Fevereiro, 2008. Disponível em: http: //mastologia.wordpress.com/2008/02/17/epidemiologia-do-cancer-de-mama-no-brasil/Acesso em: 02/03/2009.______. Estimativas da Incidência de câncer no Brasil: estimativa 2012. Rio de Janeiro: INCA, 2007. Disponível em www.inca.gov.br Acesso 11 de janeiro de 2012.VIDAL. Dolores Lima da Costa. Demanda reprimida: acesso aos serviços de saúde e Serviço Social. Serviço Social e Sociedade, n. 94, p.133 -153. Cortez: São Paulo, 2008.