Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Para além da Vigilância em Saúde em Situações de Calamidade Pública: relato de experiência sobre questões limitadoras do planejamento em saúde
Monique Bartole, Walmir Rodrigues, Monique Rocha, Poliana Jorge

Resumo


Nas últimas décadas, o número de pessoas afetadas por desastres no continente americano passou de 150 milhões com um número aproximado de 100 mil mortos (BRASIL, 2007). Embora fenômenos como enchentes, deslizamentos e inundações possam aumentar a frequência e severidade dos desastres, a vulnerabilidade das populações, ligada à capacidade de resposta das comunidades, é um fator que potencializa os riscos (SOBRAL et al., 2010). É importante considerar que as ações a serem desenvolvidas em casos de desastre não se limitam às ações emergenciais de cuidado em saúde, uma vez que esses eventos podem fazer surgir muitos outros problemas de saúde como doenças infecciosas e problemas de ordem psicológica, por exemplo (VAN DEN BERG et al., 2008). A evolução da vigilância em saúde demonstra uma relação da mesma com a promoção da saúde para que se superem os paradigmas do modelo hegemônico, centrado na tecnificação e no reducionismo biologicista. As novas concepções de saúde também têm papel ativo na ampliação das questões abordadas pela vigilância, uma vez que se observa a influência de fatores socioeconômicos, ambientais e culturais. Além disso, percebe-se que o envolvimento dos indivíduos e dos determinantes sociais que os afetam também passaram a fazer parte do escopo da vigilância (TAGLIETTA, BITTAR, PEREIRA, 2009; MELO FILHO, 2008). A utilização da visão ampliada de vigilância em saúde após desastres naturais mostra-se indispensável na busca da prevenção de riscos e agravos e da promoção da saúde, além da identificação de problemas, estabelecimento de prioridades e avaliação da efetividade das atividades realizadas (SOBRAL et al., 2010). A atuação do cirurgião-dentista em desastres geralmente envolve ações relacionadas à identificação das vítimas por meio de análises da arcada dentária, participação em equipes de resgate e tratamento de fraturas bucomaxilofaciais (WANG et al., 2009; AMERICAN DENTAL ASSOCIATION, 2009). No entanto, pouco se discutiu até o momento sobre a atuação da vigilância odontológica em situações de desastre dentre as quais, geram situações de vulnerabilidade que podem fazer surgir novos problemas em saúde bucal, além de agravar patologias anteriores. Teixeira (2002) aponta a vigilância em saúde com uma perspectiva para o fortalecimento das ações das vigilâncias sanitária e epidemiológica, assinalando necessidades de áreas e grupos específicos para que sejam traçadas e (re) organizadas ações de prevenção, promoção e recuperação da saúde. Teresópolis, cidade serrana do estado do Rio de Janeiro, foi uma das cidades atingidas pelo desastre ocorrido na região em Janeiro de 2011. Após os primeiros momentos, alguns abrigos foram montados para que as vítimas das chuvas pudessem ser acolhidas até que fosse encontrada uma solução para a questão habitacional que se apresentou na cidade. Esse é um relato de experiência acerca do desenvolvimento de um estudo do Programa de Iniciação Científica, Pesquisa e Extensão do Centro Universitário Serra dos Órgãos e que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Inicialmente, foi proposta uma reflexão sobre as condições da saúde bucal de indivíduos moradores desses abrigos em decorrência da tempestade que ocorrera no município e com isso apresentar propostas sobre mecanismos e condutas diante de episódios semelhantes a esse sob a ótica da vigilância em saúde. Assim sendo, é preciso destacar que durante o período em que os abrigos funcionaram, diversos fatos de ordem política afetaram, direta ou indiretamente, não só o andamento do projeto, mas certamente, o cuidado em saúde dos indivíduos abrigados. O que poderia ser considerado como um pano de fundo no desenrolar do presente estudo sobre ações no momento pós-tragédia tornou-se o fator principal. É importante ressaltar a questão relacionada ao prefeito e seu secretariado, os quais sofreram constantes mudanças, configurando um ambiente de incertezas à gestão municipal e, por conseguinte, às decisões em torno da população diretamente afetada e à execução do projeto. Após essas mudanças, houve um encerramento abrupto das atividades dos abrigos por conta da liberação do aluguel social e do alojamento de alguns indivíduos remanescentes em novas residências ou na residência de parentes. Ficou em evidência nesse estudo o não planejamento antecedente e ulterior ao desastre das chuvas de Janeiro de 2011 no município de Teresópolis que se agravou com as inconstâncias políticas, refletindo na organização assistencial, social e na área da saúde. Sob esse aspecto, no que tange esse estudo, pôde ser percebido que a saúde bucal, diante de uma tragédia como essa, continua a ocupar um lugar coadjuvante diante das necessidades impostas, as quais podem ser reveladas ou postergadas para outro momento, conforme o desejo e o direcionamento da gestão. Contudo, o debate da saúde bucal integrada ao processo de vigilância em saúde é de extrema importância diante de comunidades que sofreram e podem vir a sofrer catástrofes como a ocorrida em Teresópolis. Averiguar situações como essa é fundamental para a organização de instâncias governamentais para realização de planejamento de ações para a população, de modo a prevenir e/ou minimizar possíveis desastres. Referências AMERICAN DENTAL ASSOCIATION COUNCIL ON DENTAL PRACTICE; AMERICAN DENTAL ASSOCIATION COUNCIL ON GOVERNMENT AFFAIRS. The U. S. approach to dental emergency preparedness and disaster response. American Dental Association Council on Dental Practice; American Dental Association Council on Government Affairs. J. Am. Dent. Assoc., v. 140, n. 5, p. 546-547, May 2009. BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Secretaria Nacional de Defesa Civil. Conferência geral sobre desastres: para prefeitos, dirigentes de instituições públicas e privadas e líderes comunitários. Brasília: MI, 2007. MELO FILHO, D. A. Reorganização das práticas e inovação tecnológica na vigilância em saúde e os 20 anos do SUS. 2008. Disponível em: <http: //portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/reorganizacao_svs_sus20anos.pdf>. Acesso em 25/02/2011. SOBRAL, A. et al. Desastres naturais – sistemas de informação e vigilância: uma revisão da literatura. Epidemiol. Serv. Saúde, v. 19, n. 4, p. 389-402, out./dez. 2010. TAGLIETTA, M. F.B; BITTAR, T. O; PEREIRA, A. C. Vigilância em Saúde. In: PEREIRA, A. C. Tratado de Saúde Coletiva em Odontologia. Nova Odessa: Napoleão, 2009. Cap. 7, p. 131-152. TEIXEIRA, C. F. Promoção e vigilância da saúde no contexto da regionalização da assistência à saúde no SUS. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 18(Suplemento): p. 153-162, 2002. VAN DEN BERG, B. et al. The public health dimension of disasters – health outcome assessment of disasters. Prehosp. Disaster Med., v.23, n. 4, p. s55-59, Jul./Aug. 2008. WANG, L. Dentists' role in treating facial injuries sustained in the 2008 earthquake in China: how dental professionals can contribute to emergency response. J. Am. Dent. Assoc., v. 140, n. 5, p. 543-549, Aug. 2009.