Rede Unida, 11º Congresso Internacional da Rede Unida


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“AS ‘MARIAS’ DE MILTON NASCIMENTO FORAM AO CAPS, AO NASF E, AGORA, VÃO AONDE QUEREM” – CAMINHOS DE UMA EXPERIÊNCIA EXITOSA DE MATRICIAMENTO, AUTOGERENCIAMENTO E DE VIDAS
Ana Caroline Leite de Aguiar, Mariana Freitas e Silva Maia

Resumo


Recorta-se, aqui, um percurso não-linear, vivo e surpreendente de um grupo de mulheres em sofrimento psíquico que chegaram ao CAPS de Maracanaú-CE sob muitos “in”: inválidas, infelizes, incapazes, incuráveis, por relato das próprias e constatação de psicólogas da unidade quando em contato com familiares dessas usuárias e profissionais que as encaminhavam, nos quais, usualmente, identificavam-se inquietações, ou até o desprezo, ligadas a um adoecer não visível em exames clínicos tradicionais. Sintomatologicamente, as mulheres sinalizavam somatizações várias, associadas a episódios depressivos e de pânico. Socialmente, convergiam na destituição de seus papéis de mães, esposas, trabalhadoras, donas de casa e, vivencialmente, no “Já fui a vários médicos, fiz tudo quanto é exame e dizem que não tenho nada, é só sistema nervoso. Como não tenho nada e sinto tudo isso?”. Ante uma demanda significativa que, assim, chegava ao serviço supracitado, elegeu-se como proposta de acolhimento e tratamento um grupo terapêutico de mulheres (ben(m-)ditas “Marias”) que, em dois anos de duração, foi ressignificando e ampliando as autopercepções das participantes, dando olhares, vozes, afetos, contornos e novos sentidos aos “Você não tem nada” e cujos ganhos mostraram-se mais nítidos em ações das usuárias, que imprimiam, gradativamente, ao grupo um movimento marcante de corresponsabilidade, autogestão, autoestima e protagonismos de cuidados – intra e interpessoais. Frente a essa evolução e à demanda atribuída aos CAPS (transtornos mentais severos e persistentes) pela Portaria 336/02, promoveu-se uma espécie de “matriciamento coletivo” do grupo com a Atenção Básica, de modo que, aos poucos, sua facilitação foi dividida entre o CAPS e o NASF, novos vínculos fortalecidos, e o processo de autogerenciamento das usuárias estimulado. Hoje, essas mulheres sustentam uma convivência extraCAPS e extraNASF, funcionam como suporte umas para as outras, retomaram gradualmente suas funções sociais, tornaram-se parceiras daquele serviço na elaboração e execução de um grupo de familiares e na ocupação de espaços outros de pensar/fazer Saúde, como é o caso do registro resumido dessa experiência, em conjunto com as profissionais, para este Congresso. Recomenda-se, portanto e por tanto, o investimento em práticas habituais e, de fato, integrativas, de matriciamento e uma saúde (mental) da mulher que a contemple em seu trânsito de papéis/relações sociais e não a aprisione em circuitos biológicos.