Rede Unida, 11º Congresso Internacional da Rede Unida


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APLICAÇÃO DO MINI EXAME DO ESTADO MENTAL EM PACIENTES POR ABUSO DE DROGAS: UMA ANÁLISE ALÉM DA COGNIÇÃO
Lucas Costa Ifo, Nágela Maria Silva, Helga Ribeiro Albuquerque

Resumo


INTRODUÇÃO Este trabalho visa analisar a aplicação do Mini Exame do Estado Mental (Mini Mental) por monitores do Pet Saúde da Rede de Atenção Psicossocial da Universidade de Fortaleza durante a avaliação do estado cognitivo dos pacientes internados no serviço de dependência química da Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 10% das populações dos centros urbanos de todo o mundo consomem abusivamente substâncias psicoativas, independentemente da idade, sexo, nível de instrução e poder aquisitivo. Salvo variações sem repercussão epidemiológica significativa, essa realidade encontra equivalência em território brasileiro. (BRASIL, 2003).No município de Fortaleza, mais especificamente, existe um ascendente número usuários de cocaína e crack, sendo interessante observar como o aumento do número de usuários cresceu consideravelmente em menos de uma década. Duailibi, Ribeiro e Laranjeira (2008) descrevem que “no Nordeste, cujo consumo de cocaína-crack era insignificante até 1997 (em torno de 1%), subiu em 2003 em Fortaleza para 10,3% e em Recife para 20,3%, sugerindo um aumento na disponibilidade de derivados da coca nesta região”. Esta realidade nos coloca diante de uma necessidade de pesquisa e projetos de prevenção capazes de levar informação e solução ao problema.O consumo abusivo de álcool e outras drogas acaba por acarretar a maioria dos usuários, problemas de saúde mental. “A presença de um segundo diagnóstico psiquiátrico é comum entre os usuários de cocaína e crack. A depressão e os transtornos ansiosos são as comorbidades psiquiátricas mais observadas em estudos brasileiros com esses usuários”. (DUAILIBI, RIBEIRO & LARANJEIRA, 2008, p. 50 ) As drogas afetam também as funções cognitivas de maneira crescente, visto que todos os tipos de substâncias psicoativas causam efeitos sobre o cérebro e mente humana. As funções básicas da mente, tais como, a memória, atenção e concentração podem ser fortemente afetadas por estas substâncias, como comprovam estudos recentes.Os efeitos causados pela drogadição podem ser variáveis, dependendo do tipo de substância e tempo de uso, e, mesmo as drogas consideradas leves, como a maconha, podem ser devastadoras para o bom funcionamento das funções mentais.Pensando nestes efeitos causados pelas drogas, propõe-se a aplicação do Mini Exame do Exame Mental com pacientes do Serviço de Dependência Química da Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza. O Mini Exame do Estado Mental (MEEM) ou Teste de Folstein é um breve questionário de 30 pontos usado para rastrear perdas cognitivas. É comumente utilizado em medicina para rastrear demência. É também utilizado para estimar a severidade da perda cognitiva em um momento específico e seguir o curso de mudanças cognitivas em um indivíduo através do tempo, portanto fazendo dele um meio efetivo de documentar a resposta do indivíduo ao tratamento. Em cerca de 10 minutos mede funções incluindo aritmética, memória, e orientação. Foi introduzido por Folstein et al. em 1975. Esse teste não é um exame de estado mental. A forma do MEEM padrão que é atualmente publicado pela Psychological Assessment Resources é baseado no conceito original de 1975 com pequenas modificações feitas pelos autores posteriormente.NDeve ser utilizado como instrumento de rastreamento não substituindo uma avaliação mais detalhada, pois, apesar de avaliar vários domínios (orientação espacial, temporal, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem-nomeação, repetição, compreensão, escrita e cópia de desenho), não serve como teste diagnóstico, mas sim pra indicar funções que precisam ser investigadas. É um dos poucos testes validados e adaptados para a população brasileira.A partir dessa atividade de extensão acadêmica, pôde-se refletir sobre a relevância deste instrumento para a avaliação objetiva e subjetiva de pacientes em recuperação por abuso de drogas e a respeito da importância da interação entre o acadêmico e esses indivíduos de forma precoce, ainda durante a graduação, pela relevância atual da problemática do abuso de drogas como problema de saúde pública. Considera-se assim, que, na aplicação do teste com estes pacientes, percebe-se que as drogas são um dos fatores que interferem nas funções mentais, mas que o contexto em que o individuo está inserido, com relação ao seu estado psicológico e condições e níveis de escolarização, também deve ser levado em conta. Percebe-se, desta forma, o Mini Exame do Estado Mental, em sua análise subjetiva, proporciona-nos não só análise cognitiva de pacientes em tratamento da dependência de drogas, mas a identificação de potencialidades e a oportunidade de fortalecer a habilidade de reconhecer aspectos psicológicos que influenciam no processo saúde-doença. Além disto, o teste pode fornecer indícios sobre outros aspectos do meio em que o individuo está inserido e que podem influenciar no exercício de suas funções mentais. Pensa-se que esta compreensão é indispensável para a formação de um profissional de saúde preparado para corresponder às exigências atuais, e que entenda o sujeito como o resultado de vários fatores, prezando por uma prática interdisciplinar, contemplando as necessidades e potencialidades de cada paciente e uma promoção integral em saúde. METODOLOGIA Tipo de estudo: Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva, do tipo relato de experiência, vivenciada por monitores do PET-Saúde Atenção Psicossocial da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) Local: A pesquisa teve como lócus vivencial a Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, (Unidade de Referencia de álcool e outras Drogas) hospital de nível de atenção secundária e terciária em saúde, localizado no município de Fortaleza, estado do Ceará. Essas unidades de saúde ambulatorial e hospitalar servem de locais as prática dos alunos de cursos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Fortaleza e do PET saúde – Rede de Atenção Psicossocial. Período: As atividades foram desenvolvidas entre os meses de janeiro a fevereiro de 2014, em encontros semanais às quartas-feiras. Sujeitos da pesquisa: Foram entrevistados 12 pacientes, 11 do sexo masculino e 01 do sexo feminino.B Estratégia: A atividade eleita foi a aplicação do Mini-Mental, questionário internacionalmente validado. Esse questionário tem a finalidade de avaliar a cognição do paciente de forma objetiva, pontuando o desempenho do paciente conforme a resposta correta de perguntas relacionadas à áreas da cognição: orientação no tempo e no espaço, memória de registro, atenção e cálculo, memória de evocação e linguagem. Os pacientes foram selecionados segundo à disponibilidade dos mesmos no serviço . A aplicação do Mini-Mental foi realizada de maneira individual em ambiente reservado para que não houvesse fatores distratores. Antes do inicio do teste foram realizadas intervenções com cartazes contendo imagens figurativas referente a temática das “Drogas” , servindo como mediadores do diálogo, visando a reflexão dos pacientes acerca das consequências do abuso das drogas. Desse modo, foram fortalecidos os vínculos entre entrevistador e entrevistado para melhor adesão à aplicação do Mini-Mental. RESULTADOS E DISCUSSÕES A maioria dos pacientes dos pacientes obteve boa pontuação em análise objetiva pela pontuação do Mini-Mental, porém percebemos que muitos se encontravam desinteressados quanto às perguntas, denotando indícios depressivos, pois alguns, apesar de responderem corretamente as questões, mostravam-se desinteressados na aplicação do instrumento. Após a fase de avaliação da orientação, iniciamos o domínio de Registros, no qual fala-se três palavras – carro, vaso e tijolo – e se solicita que o paciente repita-as logo em seguida, sem ter direito à repetição das palavras por parte do orientador. Sendo três palavras, o máximo de pontos nesse quesito é três, porém a maioria dos entrevistados fez dois pontos. Esse resultado, para um paciente em tratamento para abuso de álcool e outras drogas, é considerado bom, visto que sua atenção pode estar prejudicada em virtude das múltiplas drogas preconizadas para esse tipo de terapêutica. Na fase de Atenção e Cálculos, grande parte dos pacientes teve dificuldade para realizar as operações matemáticas preconizadas pelo teste: Esse domínio do exame pontua um máximo de cinco pontos, grande parte dos pacientes, porém, fez cerca de 3 pontos. No entanto, 2 pacientes obtiveram a pontuação máxima, além de executarem as subtrações com extrema rapidez. Assim, em análise subjetiva, podemos denotar a extrema habilidade de tais pacientes quanto à habilidade de realizar cálculos, sugerindo que este indivíduo tem potencialidades que devem ser exploradas nos intuito de reintegrá-lo à sociedade, como em postos de trabalho que exijam tal habilidade.No domínio de Lembranças, o paciente foi estimulado a evocar novamente as três palavras repetidas na área de Registros, porém sem repetição prévia. A pontuação máxima é de três pontos por cada palavra evocada. A pontuação máxima foi de dois pontos, com uma média de 1,5 pontos. Assim, pode-se inferir que o abuso de álcool e outras drogas, independente da carga, afeta em período precoce a memória de curto período, ou seja, de evocação do indivíduo. Devemos, porém, considerar o viés do uso de medicações que interferem no sistema nervoso central no tratamento ao qual o paciente está submetido. A área de Linguagem, avalia vários quesitos, porém, como tem-se o objetivo de uma análise subjetiva no detemos em dois: a escrita de uma frase, com sujeito, verbo e predicado, e o desenho de dois pentágonos com intercessão em dois pontos. Na primeira tarefa citada, consideramos o fato de alguns dos paciente serem analfabetos e não estarem aptos a realizar tal incumbência. Àqueles alfabetizados, foi pedido para escrever uma frase que viesse à mente com início, meio e fim, para melhor entendimento. Essa foi a parte mais reveladora da aplicação do Mini-Mental, pois a partir desse comando surgiram frases que nos permitiram uma análise subjetiva profunda daquele indivíduo: “O amor é o ridículo da vida.“Amor só de mãe. “Meu Deus, tenha piedade de mim.” Diante das frases acima, pudemos perceber o estado emocional dos pacientes de maneira um pouco mais aprofundada que a preconizada pelo exame, pois, independente da frase escrita pelo entrevistado, a pontuação sempre será de um ponto, caso ele escreva uma frase contendo sujeito, verbo e objeto. Observando os aspectos mais subjetivos das frases escritas percebemos a descrença pela vida, falta de amor e o sofrimento dessas pessoas. A escolarização é outro ponto crítico com relação ao bom funcionamento cognitivo destes pacientes, visto que muitos deles não terminaram a educação básica. Vale salientar que muitos destes pacientes são provenientes de um contexto vulnerável no que diz respeito ao seu contexto socioeconômico. A dependência química é, comprovadamente, um dos fatores que contribuem para a evasão escolar, pois o vício torna-se o centro da vida do indivíduo, fazendo com que ele deixe de exercer atividades que contribuam com o desenvolvimento cognitivo e psicológico. Na segunda tarefa, foi pedido que o paciente copiasse de modo fidedigno o desenho de dois pentágonos com intercessão em dois pontos. Alguns pacientes recusaram tal tarefa, principalmente aqueles em tratamento por abuso de álcool em virtude do tremor pela síndrome de abstinência, outros fizeram de forma desinteressada, desenhando triângulos ao até círculos. Esse segundo perfil de paciente, nos chamou atenção, pelos fortes indícios de síndrome depressiva.Desta forma, ao longo do desenvolvimento da aplicação do Mini-Mental, tivemos como principal foco dessa atividade o paciente, e não no exame em si. Desse modo, pudemos perceber peculiaridades além da cognição, principalmente aquelas relacionadas com o estado emocional.