Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


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Construindo Rede de Cuidados na Atenção à Saúde Mental, Crack, Álcool e outras Drogas no Complexo Territorial do Borel – Rio de Janeiro: A construção da intersetorialidade no cotidiano
Marco José de Oliveira Duarte, Sandra Lucia Correia Lima Fortes

Resumo


Este trabalho tem por objetivo apresentar a experiência realizada através do Programa de Educação para a Saúde/Saúde Mental, Crack, Álcool e outras Drogas – PET Saúde/Saúde Mental da UERJ, desenvolvido desde 2011, através das Estratégias de Saúde da Família – ESF do Borel e Casa Branca situadas no Complexo do Borel, que engloba 7 (sete) comunidades, são elas: Borel, Casa Branca, Chácara do Céu, Indiana, Morro do Cruz, Catrambi e Bananal e que tem uma população, segundo os dados do IBGE e do cadastro das ESFs, do Complexo Borel, aproximadamente de 13.000 habitantes. A realidade desta intervenção baseia-se de forma processual na construção de uma rede intersetorial de cuidado para com os usuários de crack, álcool e outras drogas e suas famílias no território, de forma dialogada, pactuada e coordenada com outras instituições governamentais e não governamentais no cotidiano de uma comunidade pacificada na cidade do Rio de Janeiro, em que a temática das drogas não se coloca mais na forma da repressão, por um lado, ou mesmo da interdição compulsória, de outro, mas se pauta na perspectiva da autonomia e da cidadania dos sujeitos e seus direitos. A construção desta rede de cuidados pressupõe uma inversão da lógica do procedimento-centrado nos equipamentos da ESF, através de suas equipes, e da lógica da repressão, para uma ação de base territorial e comunitária que envolve outros equipamentos, serviços, projetos e instituições governamentais e não governamentais presentes no Complexo Territorial do Borel de forma dialógica, pactuada e transversal. Para tanto, de forma inédita, deparamos com a existência da Rede Social Borel que se instituiu a partir de uma articulação entre grupos e coletivos da comunidade a partir da pacificação das mesmas em 2010, tomando como referência o protagonismo dos seus moradores na defesa de seus direitos e na perspectiva de melhorar o diálogo entre sociedade civil organizada e o poder público para promover ações integradas com foco no desenvolvimento local. Nossa inserção, como representantes da universidade, mas na dobra entre formação-educação e saúde, deu-se de forma diferenciada, como parceiros externos, em conjunto com outras instituições públicas presentes no território, tais como a Unidade de Polícia Pacificadora - UPP Borel (SESP-RJ), UPP Social Borel (Prefeitura da Cidade do Rio) e Programa Territórios da Paz no Borel (SEASDH-RJ). A partir da observação e da participação nas reuniões da Rede Social Borel, no trabalho de campo, observamos a ausência de outros serviços e instituições públicas tais como a educação, a saúde, a assistência social, esporte e lazer, habitação, dentre outros. Destaca-se que uns são presentes na comunidade, tais como escola, creche e unidades de saúde, mas outros são totalmente ausentes enquanto política pública. Em primeiro momento, expomos nosso trabalho, a partir do matriciamento com as ESF, com relação ao tema da saúde mental, crack, álcool e outras drogas. De imediato fomos procurados, de forma particular, por conta do estigma e vergonha de alguns, para esclarecimentos quanto ao trabalho e de possíveis desdobramentos para o conjunto da comunidade, demonstrando com isso a falta de comunicação-informação quanto ao tratamento sobre essa questão no território, tendo em vista que o imaginário popular opera na seguinte forma de solução deste problema, ou na forma da internação ou da repressão, muito reforçado também por outras organismos públicos presentes na comunidade e mesmo organizações não governamentais, com forte conteúdo religioso. Dando continuidade, reunimos com instituições públicas estratégicas e parceiras para organização e ação coordenada da I Roda de Conversa sobre o tema com apoio da Rede Social e da UPP. A realização deste evento, inédito e singular, contou com a participação de 15 (quinze) representações de instituições governamentais e não governamentais, totalizando a presença de 30 (trinta) participantes. Como produto desta roda, criamos o primeiro Grupo de Trabalho Intersetorial – GTI com representantes das instituições presentes com o objetivo de melhor aprofundamento, reflexão, diálogo e pactuação para ações coordenadas tendo como referência a construção de uma rede de cuidados para com os usuários de drogas e suas famílias no território, tomando os serviços e projetos das mesmas a serem ofeceridos para a realidade local. Destacamos que um dos principais efeitos da construção desta rede está na aquisição de informações sobre o que cada instituição governamental e não governamental realizada no referido território. A realidade concreta de uma rede impõe a necessidade de podermos operar com os recursos existentes de cada uma e na medida em que cada representante institucional desconhecia o que os outros faziam, a primeira atividade do GTI e de forma interinstitucional foi a criação de um catálogo das instituições, grupos, coletivos e projetos governamentais e não governamentais que desenvolvem atividades no Complexo do Borel no sentido do diálogo e da conversação intersetorial para com o trato de forma ampla do conceito de cuidado no território para com os usuários de drogas e seus familiares. Assim, salientamos que algumas diretrizes éticas e políticas são comuns entre os campos que dialogam na construção desta rede de cuidados, no entanto, os sujeitos que operam essas políticas são atravessados por outros olhares, a partir de seus modos de vida e visões de mundo, e com isso, o diálogo entre os sujeitos são realizados não sem disputas ideo-políticas, contudo a correlação de forças não aniquila a diferença, ao contrário, ela é salutar, na medida que socializa e capacita para esse tipo de trabalho. Entendemos que essa atividade-frente deva ser ampliada e potencializada junto as outras comunidades pacificadas na área programática que nos circunscreve, pois favorece um repensar teórico-prático nos territórios que cuidamos, favorecendo esse tipo de ações, que é um desafio das políticas públicas presentes.