Rede Unida, 10º Congresso Internacional da Rede Unida


Tamanho da fonte: 
INFLUÊNCIA DA MÚSICA NO PROCESSO TERAPÊUTICO DE PACIENTES E FAMILIARES DURANTE A QUIMIOTERAPIA: PROMOÇÃO DA AUTOCONSCIÊNCIA NO CUIDADO
Leila Brito Bergold, Inês Leoneza Souza, Beatriz Fernandes Dias

Resumo


Introdução: Este estudo foi extraído e ampliado de uma tese de doutorado que investigou a implementação dos Encontros Musicais (EM) como estratégia de cuidado no ambiente da quimioterapia (QT). Essa estratégia grupal envolveu clientes portadores de câncer e seus familiares através de atividade musical e diálogos (BERGOLD, 2009). Buscou-se aproximar os conhecimentos do campo da enfermagem e da musicoterapia através de abordagem transdisciplinar, amparada pelo paradigma da complexidade (MORIN, 2007). A relação entre música, saúde e cultura, sustentou a utilização da música com finalidades terapêuticas (RUUD, 1998). O enfoque do presente estudo foi o papel da enfermeira como criadora de ambiente terapêutico, destacando como uma das principais ferramentas da enfermagem o uso de si mesma no contexto interpessoal através do processo de autoconscientização. Destaca-se que o ambiente terapêutico ajuda o cliente a desenvolver um senso de auto-estima e valor pessoal, melhora sua capacidade para relacionar-se com os outros, e o ajuda a aprender a confiar nas pessoas, possibilitando seu retorno ao convívio social mais preparado e seguro (TAYLOR, 1992). Objetivos: Caracterizar a influência da música no processo terapêutico dos sistemas familiares participantes dos EM; e discutir a relação entre a autoconscientização da enfermeira e a promoção do ambiente terapêutico nesse contexto. Método: Optou-se pela Pesquisa Convergente-Assistencial, por esta aproximar a pesquisa da assistência e estar voltada para a resolução de problemas ou introdução de inovações nas práticas de saúde (TRENTINI; PAIM, 2004). Foram utilizadas como técnicas para produção de dados: entrevistas individuais com clientes e familiares; investigação do prontuário; gravação dos grupos de convergência (os próprios EM); e auto-observação por parte da enfermeira. Os grupos desenvolveram-se no Hospital-Dia de um hospital na cidade do Rio de Janeiro. Os sujeitos foram clientes e familiares que participaram de pelo menos um encontro musical, num total de 27, sendo 17 clientes e 10 familiares. Foram realizados 8 EM, desenvolvidos semanalmente. Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem Anna Nery/Universidade Federal do Rio de Janeiro, protocolo nº 068/09, sendo respeitados os aspectos éticos, conforme Resolução 196/96 do CNS/MS. Resultados: A promoção de ambiente terapêutico, desenvolvido a partir do processo de autoconsciência da enfermeira estimulou a participação dos sujeitos nos EM, e a presente análise apontou os seguintes temas: Influência da música no processo terapêutico: Segundo os participantes, a música influenciou vários aspectos como a qualidade de distrair, descontrair e relaxar, desviando o enfoque da doença para a saúde. Também promoveu acolhimento, integrando as pessoas que iniciavam a quimioterapia, contribuindo para redução da ansiedade que comumente surge no começo do tratamento. A expressão através de escolhas musicais promove a aproximação e a interação grupal, favorece novas experiências, afastando os participantes de uma perspectiva de doença para compartilhamento e prazer (RUUD, 1998). O desenvolvimento de bem-estar, expressão de sentimentos e diálogos, estimulados pela música no ambiente da quimioterapia promoveu a integração entre os participantes e a formação de rede de apoio. Autoconscientização da enfermeira e promoção do ambiente terapêutico: A enfermeira esteve no papel de agente socializador e ajudou os pacientes a participarem efetivamente das atividades em grupo, auxiliando-os a desenvolver sentimentos de segurança, quando em presença dos outros clientes e familiares. O processo de autoconscientização, baseado na auto-observação durante a pesquisa, contribuiu para que a enfermeira percebesse a importância de atitude lúdica para promover descontração e acolhimento. Percebeu-se que estimular a participação dos participantes na construção conjunta dos EM, através do acolhimento das sugestões e críticas, contribuiu para a autonomia dos sujeitos. Manter uma escuta sensível junto aos participantes facilitou o estabelecimento da relação enfermeira-paciente, contribuindo para a troca de experiências e autoconscientização dos próprios sujeitos. Destaca-se que para o desenvolvimento de uma situação terapêutica é essencial que a equipe de enfermagem adote uma postura sincera, amigável e que realmente preocupe-se com os outros. O estabelecimento de uma atmosfera calorosa, de aceitação, com contribuições de todos os membros da equipe de saúde, favorece a obtenção de melhor aproveitamento no cuidado a clientes e familiares. Favorecer um sentimento de segurança é essencial no desenvolvimento de um clima terapêutico (TAYLOR, 1992). Quando os pacientes encontram um clima emocional seguro, os sentimentos de aceitação e relaxamento tem chances de manifestar-se, como ocorreu nos EM. Conclusões: O desenvolvimento dos EM, fundamentado na abordagem transdisciplinar entre enfermagem e musicoterapia contribuiu para um ambiente mobilizador da interação social e potencializador de recursos para o enfrentamento da doença. A participação nos encontros proporcionou a sensação de pertencimento, reconhecimento das emoções, percepção da vida e o desenvolvimento da consciência, o que possibilitou a ampliação da qualidade de vida dos clientes e familiares. O EM promoveu o real encontro entre os partícipes do cuidado, clientes, familiares e enfermeira, mobilizando um ambiente terapêutico no contexto da QT. A criação de espaços semelhantes pode promover a integralidade e interligar recursos criativos com outras formas de conhecimento e múltiplas maneiras de ser, como parte do processo de cuidar. Para ser terapêutico, é preciso ter respeito pelo paciente como ser humano que possui valor e dignidade, reconhecido como aliado indispensável para a formulação e implementação de seu tratamento. Essa construção conjunta deve ocorrer na produção de vida no cotidiano do trabalho de todos os profissionais de saúde, e especialmente pela enfermeira no ambiente de cuidado. A contribuição desse estudo aponta que a música pode ser um recurso ativador do processo terapêutico, favorecendo e oportunizando espaços de apoio aos pacientes e seus familiares no contexto oncológico.Referências: BERGOLD, L.B. Encontro Musical: uma estratégia de cuidado de enfermagem junto a sistemas familiares no contexto da quimioterapia. Rio de Janeiro. 2009. 240 p. Tese (Doutorado) – Escola deEnfermagem Anna Nery, UFRJ.MORIN, E. Introdução ao pensamento complexo. 3ª ed. Porto Alegre. Sulina, 2007. 120 p.RUUD, E. Music Therapy: Improvisation, Communication and Culture. Barcelona. Publisher, 1998. 204p.TAYLOR, C. M. Fundamentação da enfermagem psiquiátrica de Mereness. 13ª Ed. Porto Alegre. Editora Artes Médicas. 1992. 465p.TRENTINI, M.; PAIM, L. Pesquisa Convergente Assistencial: um desenho que une o fazer e o pensar na prática assistencial em Saúde-Enfermagem. 2ª ed. Florianópolis. Insular, 2004. 141 p.