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ATENÇÃO BÁSICA DE SAÚDE, PRODUÇÃO DE EXISTÊNCIA E CUIDADO: UMA HISTÓRIA INTERESSANTE ONDE A RACIONALIDADE MÉDICA NÃO FOI SUFICIENTE PARA DEFENDER A VIDA.
Resumo
É comum ouvir em reuniões de equipes de saúde relatos de casos difíceis de pacientes poliqueixosos com vários diagnósticos, refratários aos tratamentos propostos e que a equipe não sabe mais o que fazer para restabelecê-los em sua saúde física, psíquica e em seu bem estar. Situação vivenciada também pela equipe de saúde da UBS – ESF de Cosmópolis- SP onde o caso, descrito a seguir, evoluiu de forma surpreendente diante do desenvolvimento de uma atividade na UBS. Paciente de 62 anos, diabética, hipertensa, depressiva, com problema renal, dificuldade de andar e histórico de várias internações psiquiátricas e entradas no PS devido a crises hipertensivas e glicemia alta, frequentadora assídua da UBS e do grupo de hipertensos e diabéticos, sempre demandou muita escuta, cuidado e paciência da equipe que, apesar de seguir todas as condutas protocolares, ter todos os recursos e medicamentos necessários disponíveis para seu cuidado, nunca conseguiu controlar as recorrentes intercorrências em relação à sua saúde. Filha mais velha de sete irmãos, não constituiu família própria, vivendo sempre em função da mãe, superprotetora, que sempre limitou sua autonomia. Em 2012, a convite da Coordenadora, começou a ensinar um grupo de mulheres a pintar panos de prato na UBS. Desde então a equipe percebeu melhoras radicais em seu quadro. A hipertensão e diabetes foram controladas e a relação com a UBS mudou muito de foco. Hoje se considera parte da equipe se apresentando como profª do grupo de pintura em tecido da UBS. A poliqueixosa e descompensada desapareceu. Caminha até 4 km com grupo. Quando questionada sobre ensinar a pintar, mostra suas produções e retorna com o questionamento de como puderam achar que era louca e interná-la? Como puderam não vê-la? Isto reforça que necessidades de saúde não se resumem ao que a racionalidade médica estabelece. Para defender a vida e ampliar a potência de vida das pessoas é necessário e importante que as equipes se questionem sobre que necessidades de saúde têm as pessoas que buscam as unidades de saúde e se há algo mais que poderia ser captado e trabalhado para a produção do cuidado para além da demanda instituída pela racionalidade médica¹. A experiência vivida pela paciente ampliou sua potência de vida mudando radicalmente sua saúde e forma de andar a vida. É preciso entender que saúde é um assunto da vida que tem muito a ver com modos de estar no mundo². Muito além do que a racionalidade médica pode oferecer.
Palavras-chave
Cuidado;Produção de Existências;Necessidades de saúde
Referências
1- CECÍLIO,L.C.O.. Sobre as necessidades de saúde. 2012. Texto escrito a partir de duas produções anteriores do autor, enriquecida com discussões com alunos e trabalhaores de saúde: 1 CECÌLIO, L.C.O.. As necessidades de saúde como conceito estruturante na luta pela integralidade e equidade em saúde. In: Roseni Pinheiro;Ruben Araújo de Mattos. (Org).Os sentidos da integralidade. Rio de Janeiro: UERJ,IMS;ABRASCO,2001,p.113-126; 2- CECÍLIO,L.C.O.;MATSMUTO,N.F.. Uma taxonomia operacional de saúde. In: Roseni Pinheiro; Ruben Araújo de Mattos. (Org). Gestão em redes: tecendo os fios da integralidade em saúde. Rio de Janeiro: CEPESC,2006,p.35-39.
2-FEUERWERKER,L.C.M.. Cuidar em saúde. Coleção VER-SUS/Brasil. 2013.p.43.